Fotomemórias Ranzinzas #000

Paulo Rebêlo | junho 2023


Fotomemórias. Faz muito tempo que me pergunto o que vou (ou deveria) fazer com meus 25 anos de arquivo fotográfico. São fotografias mais ou menos profissionais, metade delas em preto e branco, que não envolvem as comidas gordas e os bichinhos fofos que coloco no Instagram.

Um arquivão que carrego desde meados dos anos 1990, meio sem razão aparente. Alguns amigos já sugeriram fazer exposição, mas não faz sentido para mim. Primeiro, por não viver profissionalmente de fotografia. Segundo, porque qualquer tipo de exposição vai contra muita coisa que acredito ao fotografar, de ser meu manto de invisibilidade. Terceiro, porque é caro demais. E de suicídio financeiro eu entendo bem, já me basta a Editora Paradoxum a quebrar todas as minhas finanças desde 2017.

Meu interesse em fotografia, desde bem novo, sempre foi movido pelo registro histórico, o ato de congelar um momento singular. Uma espécie de instante demente. Um suspiro aparentemente descompromissado que gera um compromisso perene com um momento que nunca mais se repetirá.

Fotografar, para mim, sempre foi um ato completamente oposto a escrever. E escrever foi meu ganha pão durante 20 anos na imprensa e até hoje é minha cachaça e terapia. O texto escrito permite revisar, cortar, melhorar, lamber, olhar, pensar, refletir, cuidar, apagar, transformar, editar, trocar de lugar e até jogar fora e começar tudo de novo. A fotografia não permite nada.

Não existe segunda chance para o registro fotográfico. É um instante demente e um instante imutável ao mesmo tempo. Você pode editar e cropar, mas o momento nunca vai mudar. Mas como a gente vai saber que instante foi aquele?

É por causa desse foco no registro, no instante imutável das fotomemórias, que nunca gostei e nem concordei com aquela velha máxima de que uma imagem vale por mil palavras. Por uma razão bem simples: tente explicar isso sem usar palavras. 

É verdade que algumas fotos não precisam de caracteres. Elas falam por si só, às vezes gritam. Há imagens que gritam tão alto a ponto de ensurdecer, embora geralmente elas nos façam emudecer. 

Por não conseguir refletir sem palavras, sempre achei enriquecedor o contexto por trás do registro de uma imagem: quando foi feita, qual o objetivo, se foi sorte, obra do acaso, um projeto específico, se foi planejado?

Então, muito além de imaginar o que diabos vou fazer com minhas fotomemórias e meu arquivo fotográfico, o que tem tirado meu sono nos últimos anos talvez seja a dúvida sobre o que vou fazer com tantas histórias e contextos históricos que registrei e que, até hoje, tenho guardado só para mim? Tantas estradas percorridas, tantos milhares de quilômetros sobrevoados.

Antes que eu caia na tentação do deus mercado de voltar a trabalhar 24h por dia e 7 dias por semana, comecei a sistematizar a redação desses contextos fotográficos para publicar aqui neste site, aliás, o mesmo site que tem sido meu baú de abobrinhas e textos desde 1996. Já era tempo e começo com bastante atraso.

A cada pacote de fotomemórias ranzinzas, tenho tentado escrever o contexto e curiosidades que nunca foram sequer questionadas, quiçá publicadas. A partir deste mês de junho de 2023, começo a tirar do limbo universal dos discos externos, e dos armazenamentos em nuvem, para trazer esse monte de história em pequenas croniquetas que vão acompanhar as imagens.

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