Fórum de Reforma Urbana cobra controle imobiliário

Plano Diretor // Proposta não coíbe especulação que empurra pobres para a periferia

Série // Leia também a primeira, segunda e terceira e quarta parte sobre o novo plano diretor do Recife

Paulo Rebêlo
Diario de Pernambuco – 24.abril.2008

Com o advento da especulação imobiliária, recurso considerado “legítimo” pelo mercado, para onde irá a população pobre e quais os mecanismos previstos para evitar ainda mais a segregação urbana de hoje? São apenas duas das principais perguntas – sem respostas até agora – de pelo menos 20 entidades vinculadas ao Fórum Estadual de Reforma Urbana (Feru). Presentes na audiência pública realizada na Câmara Municipal sobre a revisão do Plano Diretor do Recife, atualmente em debate por políticos, associações e profissionais do ramo, o Feru promete cobrar dos vereadores uma posição mais enérgica em relação à prefeitura e ao setor imobiliário. Árdua tarefa, ao levar em consideração o histórico dos parlamentares junto à gestão do prefeito João Paulo.

Na próxima quarta-feira (30), será realizada a segunda e última audiência pública na Câmara para coletar as sugestões da sociedade e do mercado para a atualização do plano diretor. O atual plano, em vigor desde 1991, previa uma revisão noprazo de dez anos, até hoje não concretizada e engavetada nos gabinetes da prefeitura e dos vereadores. Desde o último domingo, o Diario tem abordado a cada dia um novo assunto sobre a importante lei que define o conjunto de diretrizes para o planejamento e organização da cidade.

A representante da Feru nas audiências públicas, Lívia Miranda, levanta mais um questionamento pelo qual não se prevê revisões no relatório preliminar do Plano Diretor apresentado pelos vereadores: a retirada de famílias inteiras das comunidades pobres pela especulação imobiliária. Com o crescimento desordenado atualmente em curso no Recife, bairros outrora ignorados pelo mercado – o Coque, por exemplo – começam a se tornar atraentes para edificações, por estarem próximos a leques de serviços e desenvolvimento em seu entorno. “Todo mundo sabe que as pessoas moram em terrenos irregulares, é assim em todas as comunidades. Elas estão ali há várias gerações, criaram as famílias e, de repente, vão perder tudo. Para onde elas vão?”, indaga.

Lívia aponta que diversas locações do gênero já começaram a ser sondadas pelo setor imobiliário e que o novo Plano Diretor não aponta sequer novas diretrizes sobre o assunto. Conforme relatou ao Diario o coordenador da câmara de engenharia civil do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea), Marcos Antônio Maciel, o Plano Diretor é uma espécie de “intenções das intenções e não há como regularizar nada sem a revisão da lei de uso e ocupação do solo, além de outras leis específicas”, explicou. A constatação é unânime, mesmo pelo setor imobiliário, para quem a discussão torna-se inócua como vem sendo conduzida.

Mais grave ainda, a revisão do Plano Diretor prevê que todas as comunidades no entorno de grandes vias terão que ser realocadas, o que corrobora o temor do Feru. “Mesmo irregular, aqueles terrenos foram conquistados com muita luta e quando ninguém queria morar ali, na beira de rios, de mangues”, alerta Lívia Miranda. Tecnicamente, a nova proposta apresentada pela prefeitura classifica que oslimites das chamadas “áreas de interesse social” não vão mais valer nos entornos das vias.

Temor de aumento dos imóveis

Se por um lado os movimentos sociais questionam a prefeitura sobre a falta de diretrizes mais claras no Plano Diretor, o setor imobiliário questiona os dois lados sobre uma ameaça que atinge em cheio a classe média: o aumento generalizado dos valores de imóveis nas áreas mais procuradas da cidade. Em tese, seria um resultado direto de eventuais restrições da prefeitura para evitar a verticalização. Ou seja, poucos bairros nobres com torres residenciais espalhadas e, em outras áreas com infra-estrutura disponível, sem novas construções e sem desenvolvimento urbano.

A verticalização é um caminho sem volta, acredita o presidente da Ademi, Eduardo Carvalho. Representando o setor, Carvalho elenca dois fatores que considera cruciais: as imobiliárias constroem onde as pessoas querem; e a maioria dos bairros do Recife não têm sequer requisitos mínimos atendidos pelo poder público, como saneamento, transporte, oferta de serviços e segurança. “Pergunte a qualquer pessoa que mora em Boa Viagem se ela quer ir para o Espinheiro, Graças, Caxangá, Torreão, Arruda, Beberibe, Cajueiro. Além da praia, a questão da oferta de serviços é crucial. Na hora que restringirem a construção, é claro que o preço do imóvel irá subir. Você inverte a lei da procura e da oferta e passa a elitizar mais”, pontua.

Um outro exemplo citado pelo presidente da Ademi é o Shopping Tacaruna. “É um grande serviço, mas veja se o mercado imobiliário cresce ali. Não cresce. Recife tem um entorno de violência muito grande, ou você está dentro ou está fora. Se a cidade tivesse saneamento, segurança e transporte de qualidade, não precisaríamos discutir sobre para onde crescer”, acredita. “Em vez de cobrarem o mínimo do poder público, acham que somos os vilões. Habitação resgata cidadania e convivência familiar, o debate está sendo manipulado”, ataca.

Milton Botler, assessor especial da Secretaria de Planejamento para o Plano Diretor, não vê muita saída. “Não há lei e nem previsão para punir o poder público caso não aprove um novo plano diretor”, afirma confiantena aprovação da proposta que está na Câmara e consciente que o debate vai continuar.
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Série // Leia também a primeira, segunda e terceira e quarta parte sobre o novo plano diretor do Recife

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