Desencontros entre a PCR e o setor imobiliário

Plano Diretor // Prefeitura e empresários também divergem sobre limites para construção

leia também: primeira e segunda parte da série sobre o novo plano diretor do recife

Paulo Rebêlo
Diario de Pernambuco – 22.abril.2008

Contrariando o senso comum de que a Prefeitura da Cidade do Recife (PCR) e o setor imobiliário caminham de mão juntas na revisão do Plano Diretor, curiosamente os dois lados também não se entendem. Cite o assunto para qualquer movimento social ou para a maior parte dos urbanistas e você sempre terá dois “inimigos” em comum: a prefeitura e o mercado. Conforme o Diario tem publicado, desde o último domingo, o atraso de seis anos na apresentação de um projeto conclusivo tem muitas causas e supostos culpados. Somente na Câmara Municipal, ficou engavetado por dois anos.


Um relatório preliminar está em discussão no momento e até a próxima (e última) audiência pública em 30 de abril, na própria Câmara. Como um plano diretor organiza o crescimento e o funcionamento da cidade como um todo, ao estabelecer diretrizes em meio ambiente, urbanismo, habitação e até investimentos sociais, certas colisões entre diversos interesses envolvidos são previsíveis. O atual plano em vigor no Recifedata de 1991, pelo qual se previa uma revisão após dez anos, nunca realizada, mas muito discutida.

O presidente da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Pernambuco (Ademi), Eduardo Carvalho, rechaça as acusações coletivas de urbanistas e dos movimentos sociais, sobre as quais as imobiliárias seriam responsáveis pelo lobby negativo, junto à prefeitura, para impor os próprios interesses e poderem construir onde quiserem, sem restrições e sem direcionamentos. “Há uma distorção grande na relação entre o mercado e o Plano Diretor. Na realidade, o pessoal conhece pouco o código de obras e fica imputando ao setor fatos inverídicos”, garante.

A principal crítica da Ademi, contudo, recai sobre a própria atuação da PCR na questão. Eduardo Carvalho pondera ainda mais a polêmica com a questão da infra-estrutura. Para ele, se o mercado seguir à risca o conceito de que o Recife não possui estrutura para tantas construções, não se construirá mais nada. Sobre o poder público, ele enfatiza: “temos apenas uma mínima porcentagem de saneamento na região; as obras viárias são pouquíssimas e não acompanham o crescimento; a questão do trânsito é crucial, se vende 3,5 mil carros novos por mês no Recife. O que os prédios têm a ver com tudo isso?”, ironiza, afirmando que a cidade precisa é de um bom gerenciamento de trânsito (hoje inexistente) e outras ações do poder público.

Revisão – As regras para uso do solo do Recife, cuja revisão na lei sequer é sugerida pelo novo Plano Diretor no atual debate, é um dos poucos pontos em comum entre o setor imobiliário, movimentos sociais e urbanistas ouvidos pelo Diario. Todos são unânimes em apontar a morosidade da prefeitura na questão. O presidente da Ademi acredita que “o cidadão leigo se deixa influenciar demais por afirmações que não são verdadeiras” e cita a questão estrutural do solo. “Temos inúmeras regiões na cidade onde a construção de prédios é inviável por não haver profundidade no subsolo. Além do mais, os lotes são pequenos, porque o sistema de loteamento é antigo e nuncafoi revisado, então é lógico que haverá uma verticalização e concentração maior em áreas com estrutura”, aponta.

Gestão do PT aposta na aprovação do plano

Um dos vários fatores obscuros no Plano Diretor do Recife, pouco divulgado e até mesmo desconhecido por parte da sociedade em geral, é que simplesmente não existe nenhuma previsão de punição caso a prefeitura não regularize a revisão. Ou seja, se um novo plano está atrasado há seis anos – como é o caso agora – significa que pode atrasar ainda mais, por tempo indeterminado, enquanto os interesses não convergirem a um denominador comum.

Quem aponta a falta de uma lei nesse sentido é o arquiteto Milton Botler, assessor especial da Secretaria de Planejamento da cidade e uma das maiores autoridades no setor público quando se fala em Plano Diretor. Convocado pela PCR em meados de 2004 para dar celeridade à revisão do plano, Botler garante ter começado uma revisão naquele mesmo ano. As mudanças foram apresentadas apenas em 2006, quando o texto foi submetido pelo prefeito João Paulo (PT) à Câmara Municipal, para análise e votação. O tempo engavetado naquela Casa (dois anos) é um dos exemplos citados por Botler para apontar que a prefeitura não demorou tanto assim. “Considero três a quatro anos bem razoável, são centenas de emendas e questões bastante complexas. Veja o caso dos vereadores, levaram dois anos para apresentar o relatório preliminar”, pontua.

Desde 1991, com a aprovação do Plano Diretor ainda em vigor, se sabia que dez anos depois uma revisão se faria necessário. Em 2001, houve a Conferência das Cidades e várias propostas foram apresentadas, mas diversos setores da sociedade e ONGs culpam a PCR de ter suprimido a participação popular e apresentado um projeto muito diferente. A acusação é que os interesses do setor imobiliário foram colocados à frente do bem comum. Botler não acredita 100% nesta versão, pois, como explica, o que chegou às mãos da PCR após a Conferência de 2001 foi uma série de propostas genéricas demais. “Está havendo uma politização desta questão e tantas outras, como o Parque Dona Lindu e o Corredor Leste-Oeste”, dispara.

Nos próximos dias, o Diario continuará abordando como a revisão do Plano Diretor afeta os bairros nobres e a periferia, além de polêmicas como o parque de Boa Viagem.
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leia o restante da série sobre o novo plano diretor do recife
primeira parte
segunda parte

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