CONTROVÉRSIA // Dia tumultuado teve nova suspensão da sessão e até detenção de vereador
Paulo Rebêlo
Diario de Pernambuco – 08.março.2008
O clima pesou em Custódia, a 340 km do Recife, no sertão do Moxotó. A cidade parou para acompanhar, durante a manhã de ontem, o resultado da sessão na Câmara de Vereadores para destituir do cargo o prefeito Nemias Gonçalves de Lima (PSB). Ele é acusado pela oposição de uma série de irregularidades na esfera político-administrativa. Com nove vereadores na cidade, dos quais apenas três são do grupo aliado ao gestor, a sessão para votar o impedimento já foi adiada várias vezes por meio de liminares na Justiça e o nível de tensão chegou ao ápice quando a polícia deu voz de prisão ao presidente da Casa, Cristiano Teixeira Dantas (DEM), principal voz opositora ao prefeito. Ele foi solto três horas depois, após prestar esclarecimentos, mas as versões são contraditórias.
A maioria dos vereadores tenta formalizar o processo de impeachment há mais de um ano e, de acordo com Cristiano Teixeira, várias acusações já foram recebidas e o prefeito já teria sido denunciado pelo Ministério Público à Justiça. Entre as acusações, há o descumprimento da Lei Municipal n.º 780/2007 que regulamenta a eleição direta para diretor de escolas municipais, descumprimento da lei sobre o Plano de Cargos, Carreiras e Remuneração do Magistério, emissão de declaração falsa para a Caixa Econômica Federal e até mesmo invasão de terras públicas.
O prefeito Nemias nega todas as denúncias. Em uma das tentativas da Câmara de cassar seu mandato, no final do ano passado, o prefeito não mediu críticas e chegou a classificar os integrantes da comissão processante de “vagabundos”. Segundo Nemias, a oposição quer tirá-lo da prefeitura a qualquer custo. “A Justiça irá decidir a questão, não vai dar em nada, todas as denúncias são improcedentes. Sou prefeito de Custódia pela segunda vez e sou candidato à reeleição”, finalizou. Desde então, as tentativas dos vereadores são sempre suspensas ou adiadas por meio de liminares na Justiça.
E foi justamente a Justiça que emperrou o processo Legislativo de novo. O desembargador do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), Antônio Camarotti, concedeu nova liminar suspendendo a sessão de ontem, constatando a nulidade do processo de votação do impeachment. No entanto, a sessão continuou e por 6 a 0 prosseguiu-se a cassação. Os três vereadores da oposição se retiraram do plenário e não votaram. De acordo com Teixeira, o oficial de justiça chegou apenas ao final da sessão e não portava documentos originais. “Ele trouxe a cópia de um fax, isso não tem valor judicial, não aceitamos e prosseguimos com a votação”, disse, acrescentando que a assessoria jurídica da Câmara orientou a não aceitar a documentação. “Faltavam poucos instantes para encerrar a votação, entendemos não ter legitimidade”.
Outro lado – A versão do prefeito Nemias, porém, é diferente. De acordo com sua equipe de advogados e de suas filhas, que conversaram com o Diario por telefone, o oficial de justiça chegou quando um dos advogados do prefeito fazia sua defesa. “A sessão é nula, eles ignoraram o documento judicial e o ato que eles fizeram não tem validade”, garante Luciara de Lima, uma das filhas. Nemias foi localizado apenas no final da noite de ontem e confirmou a versão.
Cristiano Teixeira garante que a decisão da Câmara é final. “O prefeito está cassado e vamos empossar o vice-prefeito José Wilson nesta segunda-feira”. O vice é aliado de Nemias e também é do PSB, mas segundo o presidente da Câmara, “é um homem de bem, tem grau de escolaridade maior, é médico, tem mais tempo na política e é mais consciente. Vamos trabalhar pela governabilidade”, explicou. Procurado pelo Diario, o vice-prefeito José Wilson não atendeu aos telefonemas em seu celular.
Batalha judicial foi intensa
Cópias de documentos obtidas pelo Diario mostram um pouco do desenrolar dos acontecimentos que culminou com a detenção do presidente da Câmara de Vereadores de Custódia, Cristiano Teixeira. Por telefone, ele garante que não foi preso. “Apenas fui à delegacia para prestar esclarecimentos e, inclusive, fui e voltei em carro próprio, não houve nada disso que os advogados do prefeito falaram”, disse.
Logo durante a manhã, um dos advogados do prefeito Nemias de Lima, Edilson Xavier, confirmou ao Diario a prisão do vereador. “Ele desobedeceu uma ordem judicial e está preso na delegacia de Custódia”, garantiu. Segundo Luciara de Lima, filha de Nemias, quando os vereadores decidiram não acatar a ordem judicial, o oficial de justiça retornou e o juiz da comarca de Serra Talhada emitiu o mandado de prisão.
Em um dos documentos obtidos pelo Diario, consta a declaração do comandante do Ciosac (Companhia Independente de Operações e Sobrevivência na Área da Caatinga), Alfredo Wanderley de Carvalho, relatando a chegada de16 policiais do Ciosac (um órgão da Polícia Militar), às 7h30 da manhã de ontem, para garantir a segurança dos populares presentes nas imediações da Câmara. A operação contou com um adicional de outros 12 policiais do 3ª BPM. No relato, o comandante garante que o processo de cassação teve início às 10h20, horário similar ao dito por Cristiano Teixeira. O comandante relata que às 13h30 foi informado sobre um ofício trazido pelo promotor de justiça Diego Pessoa. A declaração de Alfredo Wanderley menciona a voz de prisão dada ao vereador Cristiano Teixeira, por ter descumprido a decisão do TJPE para encerrar os trabalhos de cassação do prefeito.
Em outro documento, uma certidão revela o nome do oficial de justiça Cleves Nunes Barros, que certifica ter entregue às 13h (ou seja, pouco antes de o comandante do Ciosac tomar conhecimento) a notificação ao presidente da Câmara e ao presidente da comissão processante, José Luciano de Lira. A notificação mencionada pelo oficial de justiça é assinada pelo juiz de Serra Talhada, Artur Teixeira de Carvalho Neto, cuja ordem de suspender o andamento dos trabalhos seguia a decisão prolatada pelo desembargador Antônio Camarotti, relator substituto do processo 166770-1, de autoria do prefeito Nemias de Lima contra a comissão processante da Câmara. Segundo consta nas informações processuais no site do TJPE, o agravo de instrumento 166770-1 teve sua conclusão na noite de quinta-feira, às 18h58, suspendendo os trabalhos da comissão processante.