Política externa norte-americana esteve no debate da campanha, mas não citou os vizinhos latino-americanos além do discurso de praxe
Paulo Rebêlo
Diario de Pernambuco
02.novembro.2008
Para a América do Sul, a campanha presidencial nos Estados Unidos chega ao fim do mesmo jeito que começou: totalmente no escuro. Terça-feira, quando o eleitor norte-americano for escolher entre o democrata Barack Obama e o republicano John McCain, gestores e autoridades latino-americanas continuarão sem saber quais as diretrizes esperadas para os vizinhos do hemisfério sul.
Um dos pilares mais frágeis do país na última década, a política externa norte-americana esteve na berlinda durante toda a campanha. Contudo, e sem surpresas, a guerra do Iraque, a luta contra o terrorismo e os lucros do petróleo árabe centralizaram a agenda de debates externos. Para a América Latina, sobrou apenas a praxe discursiva de que “é preciso estabelecer um diálogo mais aberto e propositivo”.
Além de questões tradicionais como especulação financeira, balança comercial e etanol, os Estados Unidos possuem uma dependência significativa da América Latina caso queiram tentar uma nova política de boa vizinhança. A investida “contra o imperialismo” de Chávez, na Venezuela, é apenas parte do problema.
O embargo comercial de Cuba, as vinhetas revolucionárias (e inesperadas) de Fernando Lugo no Paraguai, a inesgotável crise política da Bolívia, além da recente retomada de crimes urbanos na Colômbia integram o quadro sombrio por onde os Estados Unidos poderiam, em tese, exercer influência.
Laura Carlsen, do Center for International Policy na Cidade do México, vai mais além. Para ela, 50% de todo o território latino-americano se encontra em situação problemática para a política externa dos EUA. “A liderança da Venezuela em questões específicas do continente, tanto no quesito integração quanto em solidariedade, atraiu investimentos e atenções de importantes países europeus e da China, de modo a diminuir consideravelmente a influência na região”, explica.
Outro problema grave citado por Carlsen é a falta do senso de oportunidade. Hoje, há uma série de movimentos e lideranças que rejeitam o modelo de comércio livre (free trade) pela qual reza a cartilha norte-americana. “Em vez de olhar para isso como uma chance de cooperar e, talvez, diminuir a pobreza e o subdesenvolvimento, os Estados Unidos acharam por bem classificar como uma ameaça”, pondera.
Um pouco mais otimista, o senador norte-americano Chris Dodd não acredita mais em ditaduras militares e conflito de ideologias leste-oeste nos países da América do Sul. Em carta aberta aos candidatos à presidência, Dodd clama por uma mudança de conceitos: “Chegou a hora de entendermos que a América Latina não é o nosso quintal, e sim a nossa vizinhança. O confronto entre nós precisa ser revertido, desde problemas de segurança nacional à imigração ilegal, sem contar o tráfico de drogas”, explica.