Paulo Rebêlo | 30.nov.2011 *** Não me importaria se, ao chegar em casa cansado do expediente, três mulheres de vestidos floridos e cabelos vermelhos estivessem me esperando. Uma para coçar a barba, outra para coçar o bucho e a terceira para os serviços gerais. O problema é que, quando a gente chega de viagem, queremos distância de toda a lascívia. Real ou imaginária. Mesmo que sejam vinte mulheres lindas de vestidos de botão e unhas grandes. Porque não importa quantos aeroportos a gente conheça ou quantas vezes já tenhamos feito a mesma viagem ou roteiro. Todo desembarque é um ato solitário que enfraquece até a mais sólida das solidões. Não faz diferença se é um voo de 45 minutos ou 14 horas de trem. O desembarque deixa qualquer um meio perdido e, em todos os lugares, me parece a mesma tristeza de sempre com aquelas pessoas alteradas e apressadas para ir embora. Talvez por isso ninguém consiga explicar direito a pequena grande alegria de você se enfiar no meio daquela multidão e encontrar uma pessoa que lhe espera. Dar um abraço em silêncio e um cheiro prolongado. Para enfim sair andando calmamente. Quem sabe essa pessoa nem goste mais tanto assim
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Terra Magazine – abril.2010 Não parece, mas toda mudança me parte o coração. Seja de bairro, cidade ou país. Seja em lugares onde morei cinco anos, cinco meses ou até mesmo cinco semanas, como já aconteceu certa vez. Do dia em que cortaram meu umbigo gordo até hoje, são 14 mudanças de CEP. Com exceção de uma, na qual ainda era muito guri, lembro de todas as outras 13 como se fosse hoje. Por mais desregrados que tentemos ser, sempre sobra saudade por abandonar as poucas raízes que a gente deixa pelo caminho. E me pergunto se vamos voltar a nos encontrar um dia, nem que seja para um café com bolo de bacia na padaria. É o garçom no bar da esquina que já se considera um amigo e fala dos problemas domésticos, pede conselhos e sempre lhe consegue um pedaço extra de bife sem cobrar nada. É o porteiro que está sempre dormindo quando você chega bêbado e fica no meio da rua, esperando ele acordar e abrir o portão, como se nada tivesse acontecido. É o zelador evangélico que lhe acha um devasso. A secretária que abre um sorriso largo quando lhe vê, por causa do bombom de cupuaçu.