Na ficção juvenil de Highlander, os imortais só morrem se tiverem a cabeça cortada. Na obra prima de Bergman, a cabeça do cavaleiro entra em parafuso durante uma partida de xadrez com a Morte. Na dúvida, espero que deixem a minha no lugar. E resolvi voltar a jogar xadrez.
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A gente costuma dizer que ninguém deve ter raiva de quem morreu. Eu tenho. Quando vejo amigos queridos desesperados, sem saber o que fazer e sendo cutilados financeiramente por funerárias, advogados, empresas fantasmas e golpes de todo tipo, tenho muita raiva. E anoto o nome de todos esses defuntos para que eu mesmo vá entregar uma carta de despejo quando for minha vez de chegar onde eles estão, seja lá onde for.
A estrada ficou mais longa, as pessoas ficaram mais distantes. As reuniões continuam inúteis, os doguinhos continuam abandonados, o espetinho continua borrachudo, a pizza continua ruim e até os jagunços são os mesmos; pois agora são os filhos daqueles que há 25-30 anos sentavam ao meu lado com a faca na cintura.
Meus avós eram crianças e o Brasil era o país do futuro, eu cresci lendo a mesma coisa e você provavelmente também, hoje estamos todos pareados na amizade com a foice da Morte e continuamos ouvindo que somos o país do futuro, a diferença agora é ter a certeza que esse futuro não é nosso presente porque nunca foi nem o nosso passado. Resta-me acreditar que seja o futuro dos netos que não vou ter.
Cascavilhei o meu cabeção em busca da primeira memória da minha vida. Tento abrir meus diretórios mentais à procura do que passei a admitir como a memória zero: uma lembrança imagética, consistente e contextualizada que defina a nossa existência cognitiva. Minha memória zero só aparece aos três ou quatro anos de idade e se resume a um bolovo.