Paulo Rebêlo | agosto 2021
Do Oiapoque ao Chuí, de Ushuaia a Vladivostok, as respostas das pessoas costumam ser muito iguais.
Não é sempre entediante, mas é sempre frustrante sermos tão iguais e previsíveis.
Escrevo respostas de propósito.
Gosto mais de responder do que de perguntar. Porque perguntar exige um desprendimento que não tenho.
Uma pergunta costuma exigir uma resposta, enquanto a resposta não exige nada. Nem mesmo que você acredite nela.
A resposta se encerra.
E as respostas são iguais porque o mundo é uma bola e sete bilhões de pessoas pensam – e sonham e esperam – exatamente as mesmas coisas, as mesmíssimas coisas, com seis a oito arquétipos universais de personalidades muito bem definidas e muito bem estudadas.
Personalidades que a gente identifica em poucos minutos de conversa. Às vezes, uma única resposta já basta e a gente já sabe exatamente quem elas são, o que elas querem e o que faz elas se levantarem de manhã.
Não é dom, é maldição.
Mesmo com a certeza da identificação de arquétipos, a gente não consegue ter desprendimento suficiente (talvez pela timidez?) para usufruir e tirar proveito do que conseguimos antecipar tão claramente.
Vira um sofrimento diário: ler as pessoas pelos olhos, pelos gestos, pela posição das mãos, pelos ombros e até pelo silêncio.
Fica pior. É comum identificar sentimentos que elas ainda estão tentando decifrar o que é. E talvez demorem muito a conseguir.
Já ouvi algumas pessoas dizerem que gostariam de conseguir ler esses sinais invisíveis que nos parecem tão visíveis. Talvez seja pela esperança de saber quando o outro está interessado ou apaixonado?
Não queira, pois é um desastre anunciado. Você também vai saber quando o outro não sente mais o mesmo. Mesmo que diga o oposto entre juras de amor.
Você vai saber quando o amigo duvida de você, mesmo dizendo o contrário. Quando o colega faz pouco caso, menospreza, diminui ou desvaloriza, mesmo quando as palavras expressam algo diferente.
A gente afunda num poço de incerteza interna por causa das certezas externas.
E essas certezas nos deixam inertes e sem saber o que fazer, por exemplo, quando percebemos uma amiga infeliz no relacionamento, mesmo quando ela está sempre sorridente ao lado do parceiro.
Quando as fotos do casal feliz nas redes sociais mostram o exato oposto.
Quando os amigos estão julgando e menosprezando seus valores ao mesmo tempo em que lhe apoiam e até oferecem incentivo.
Sabe, outro dia me vi pensando que talvez os aratacas que criaram as técnicas pseudocientíficas de programação neurolinguística (PNL), nos anos 70, fossem apenas pessoas bem-intencionadas. Talvez tivessem a inútil esperança de sistematizar a neurolinguagem em modelos pré-definidos que pudessem ser replicados.
Infelizmente — para eles e para mim — todo o conhecimento neurológico que a ciência dispõe mostra o quanto é impossível reprogramar comportamentos por modelagem.
Se fosse possível, acredite, eu seria o primeiro a me desprogramar totalmente.
Foto em destaque:
Estufa em cativeiro de camarão.
Macau, Rio Grande do Norte, Brasil.
Setembro 2019.
Canon 6D | 1/400s | f/8.0 | ISO 100 | 24mm
1 comments On Respostas invisíveis para perguntas audíveis
Envolvente e muito reflexiva. Durante a leitura dessa crônica, fiz uma curta viagem em respostas que me despertaram a querer essa “maldição”.
Adorei a programação de preencher automáticamente.