A fuga das Copinhas

Paulo Rebêlo // junho.2006

Santa paciência, Batman. Ninguém mais agüenta ouvir falar em Copa do Mundo. Nunca foi preciso derrubar tantas árvores no planeta para ler as mesmas análises enfadonhas em praticamente todos os jornais brasileiros. Enquanto a mídia, que está careca de Ronaldo e sob todo o peso da atividade diária, perde-se em abobrinhas sobre a vida e os costumes na Alemanha, as pessoas espertas aqui mesmo no Brasil, debaixo do seu nariz, estão aproveitando a Copa para fazer o que pode ser feito de melhor durante um evento de tamanha grandiosidade: pular a cerca.


Enquanto as operadoras energéticas divulgam o balanço e as planilhas sobre a gritante alta de consumo nos intervalos e aos fins dos jogos da Seleção, os donos de motéis já estão festejando vários hexa-campeonatos em lucros. Se o Brasil é a pátria de chuteiras, os motéis são o porto seguro de quem, dificilmente, consegue uma folguinha do parceiro para respirar novos ares e adentrar novos mares.

Durante os 90 minutos em que os carecas milionários estão em campo, os peludinhos pelados podem usufruir de uma paz poucas vezes presenciada nas cidades grandes. Nos jogos da Seleção, tudo é perdoado, tudo é argumento, qualquer atividade serve como desculpa para sair de casa e ir confraternizar com os amigos no bar. Levando em consideração que é preciso chegar cedo no recinto, pelo menos uma hora antes, e depois da partida mais uma hora para tomar as cinco saideiras e pagar a conta, não é difícil entender que as promoções de 4 horas + refeição grátis dos motéis são o equivalente à taça mundial.

Na Copa do Mundo, aquele cidadão que não tinha sequer uma folga para pular a cerca, agora tem semanas de felicidade pela frente. Aquela jovem senhora casada, que há muito não sabe mais o que é levar um gol de placa entre as traves, pode finalmente colocar para fora toda o patriotismo e o amor pela Seleção Brasileira e ser feliz, nem que seja durante os 20 minutos do intervalo entre o primeiro e o segundo tempo. Afinal de contas, até os motéis-quiosque de cinco reais têm pelo menos uma TV preto e branco, mesmo quando fica presa em uma grade fechada com cadeado, como é comum nos quinta-categoria da cidade.

É na Copa do Mundo que o nobre cidadão pode chegar bêbado em casa depois de uma tarde no bar, porque ama o seu país, a pátria. Mal sabem os reles mortais que, durante os 90 minutos anteriores, ele fez mais gols do que toda a Seleção Brasileira reunida. E é na Copa do Mundo que muitos divorciados, casais infelizes e solteiros deprimidos entendem que, lá fora, há muita gente interessante que bate um bolão – mas que, eventualmente, precise enfrentar uma crise ronaldiana de pressão e auto-estima. O que falta, seja para o careca milionário ou para o resto de nós, mortais, é apenas o primeiro gol. E precisa de incentivo melhor do que o amor à pátria?

Será um longo domingo de futebol.

Dez anos sem solidão

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