A redescoberta do MP3 – parte II

Paulo Rebêlo
Revista Backstage
maio 2006

Na coluna anterior, fizemos um retrospecto sobre as (in)capacidades técnicas do formato MP3, o qual apesar de notáveis desvantagens tecnológicas e comerciais frente a formatos concorrentes de áudio digital, continua a ser a grande vedete da música na Internet. Não à toa, é o mais popular, flexível e universal. Vários aspectos, não apenas técnicos, comerciais e históricos, foram abordados no último texto. Contudo, o melhor – ao menos para os fãs do formato – deixamos para agora: como os especialistas estão trabalhando para aperfeiçoar o MP3, desde medidas simples até iniciativas mais complexas que tendem a incomodar os céticos.

Comecemos pelo simples. Onze anos após ter surgido, somente há poucos meses é que os mágicos da informática resolveram turbinar o padrão por trás do MP3 com um recurso deveras singelo, porém de muito bom grado para os fãs da boa música: o efeito surround. Parece uma coisa boba, mas tecnicamente fez com que os engenheiros do Instituto Fraunhofer, que é onde o MP3 nasceu, queimassem as pestanas para conseguir criar um codificador e decodificador adequado e de qualidade.

O efeito surround é bem utilizado no cinema, mas já estava disponível há mais tempo em formatos de áudio concorrentes, mais recentes e amplamente utilizados por iniciativas comerciais. Mas, não pelo MP3. Com o codificador surround, a qualidade final do áudio é perceptivelmente melhor. Se você tocar um MP3 em um aparelho portátil que não tenha suporte para o recurso surround, não tem problema. O produto identifica o arquivo como um MP3 de alta qualidade. Eis um dos principais, se não principal, diferencial do padrão MP3 antigo e novo: a retro-compatibilidade.

No site oficial da novidade no Instituto Fraunhofer (www.mp3surround.com), que nem é tão novidade assim, mas poucas pessoas sabem, é possível fazer o download gratuito de uma ferramenta para converter música e áudio para MP3 Surround. Para escutar no computador, é preciso usar um software (player) com suporte ao efeito surround, que também pode ser baixado diretamente do site, sem custos. Softwares mais novos de mídia e entretenimento, além de modelos recentes de aparelhos portáteis, já possuem o suporte nativo ao MP3 Surround.

O melhor de tudo é que, com o codificador do Instituto Fraunhofer, você pode converter até suas atuais MP3 (que só têm dois canais de saída, estéreo padrão) para o novo formato de alta qualidade MP3 Surround. E mesmo essas MP3s poderão ser ouvidas em qualquer lugar, com ou sem suporte ao efeito. Quando não houver suporte, o player interpreta como um arquivo de alta qualidade. E tem mais: com as ferramentas apropriadas, é possível fazer conversões do MP3 para o padrão 5.1 (canais de saída), como ocorre em jogos de última geração, filmes em DVD e praticamente tudo que for relacionado a multimídia hoje em dia.

E quem diria que, até poucos meses atrás, nada disso existia no MP3. Era apenas um formato padrão e universal para escutar músicas, com um certo limite de qualidade no arquivo, sem recursos extras, sem diferenciais. A idéia é que, com o tempo, novos recursos comecem a surgir.

MP3 x MP4 – A inclusão do efeito surround no MP3 causa um efeito bem interessante, seja do ponto de vista do ouvinte, como também do produtor e divulgador. No entanto, é apenas uma agulha no palheiro diante de outras iniciativas que podem, e devem, aparecer daqui para frente. Principalmente na questão comercial, quesito onde o MP3 perde feito de quase todos os concorrentes.

Para muitos usuários e até especialistas do setor, o ideal é que o MP3 não se torne um formato tecnicamente avançado para uso comercial, como é o caso, hoje, do Windows Media Audio (WMA) e do AAC, usado no iTunes/iPod, por exemplo. Por que? Porque do jeito que está, o MP3 representa o que a Internet teria, em tese, de melhor: a falta de amarras, a liberdade irrestrita e não-geográfica, enfim, a pureza dos primórdios da Internet onde tudo é livre e permitido.

Opiniões e ideologias à parte, o fato é que os técnicos e engenheiros, não somente do Instituto Fraunhofer, continuam as pesquisas e revisões dos algoritmos de compressão do MP3 para fins de aperfeiçoamento. No passado, sobretudo no final dos anos 90 e início do ano 2000, outras idéias foram colocadas em debate para aprimorar o MP3, todas elas sem sucesso. Até agora.

Uma dessas idéias era de, aos poucos, ir fazendo a cabeça dos usuários de abrir mão do MP3 e ceder lugar ao MP4. Por sinal, o MP4 existe até hoje e é bem utilizado, mas não em áudio. O MP4 é apenas a abreviatura de MPEG4, um algoritmo bem avançado de compressão que achou bem mais receptividade (e uso) para vídeos, adotado por formatos como DivX e Xvid para transmitir e baixar filmes pela internet. No entanto, poucos sabem que o mesmo MPEG4 poderia (pode) ser utilizado para áudio, gerando um arquivo de música com bem mais qualidade e, eventualmente, maior tamanho.

A questão é que o MP4 nunca pegou de verdade como substituto do MP3, sequer como complemento. Enquanto, para vídeo, foi e continua sendo um sucesso. Não à toa, os novos formatos de DVD que vão surgir este ano, usam algoritmos e padrões baseado no MPEG4. O que é bem interessante, ao notar a indústria mundial adotar algo que vinha sendo utilizado, principalmente, pelos piratas de filmes na internet há vários anos. Vale lembrar que foi ali entre 2000 e 2001 que o MPEG4 tomou forma, de verdade, como meio de divulgação de massa de vídeos na Internet. Graças ao fiasco da tentativa de usá-lo como adicional ou substituto do MP3.

A própria Fraunhofer já presenciou fracasso quando o assunto foi inovação. Em 2001, o instituto anunciava um tal de MP3Pro que, em tese, seria mais ou menos o que o MP3 Surround é hoje, só que sem o efeito surround. O diferencial do MP3Pro nada mais era do que alta qualidade nos arquivos de áudio, porém, a um custo alto. O novo padrão não foi adotado pelos softwares da época, principalmente, porque o codificador para MP3Pro era pago e, no caso das empresas que quisessem embutir um suporte nativo, o custa não era tão barato assim.

Em outras palavras, o MP3Pro foi ignorado por usuários e pela própria indústria que, já naquela época, não via funcionalidades comerciais o suficiente para apostar pesado no MP3, como ocorreu de fato, em seguida, com o AAC e com o WMA da Microsoft. Agora, com o MP3Surround, ninguém sabe se as pessoas e a indústria de música digital irão, novamente, ignorar. Por ser bem novidade e ainda com pouca divulgação, resta esperar. Aos entusiastas do áudio, porém, vale a pena visitar o site oficial do Instituto Fraunhofer, conhecer o material mais técnico e fazer o download dos codificadores e softwares para escutar MP3 com mais qualidade.

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