Primeiros passos de uma longa jornada

Paulo Rebêlo
Revista Backstage
outubro 2005

Ainda é pouco, bem pouco, mas finalmente as gravadoras que dominam o mercado mundial de música parecem mostrar um mínimo de noção da realidade sobre música digital. A Warner Music Group anuncia agora, oficialmente, a criação de uma nova gravadora exclusivamente digital, com objetivo de promover novos artistas. Em vez de os tradicionais lançamentos por CDs, a iniciativa irá lançar um pacote na Internet com três a quatro canções em intervalos periódicos.

De acordo com a Warner, a existência da gravadora digital pode tirar um pouco da pressão e das exigências burocráticas para novos artistas, aqueles que ainda não conseguiram se tornar bem conhecidos de público. Ao optar por poucas faixas, em vez de um álbum inteiro, os artistas também poderiam se dedicar mais à composição das canções, com calma, sem a pressa exigida pelas campanhas publicitárias, pelo marketing e pelos compromissos financeiros firmados.

Ao aderir ao método digital de distribuição, a Warner garante que tudo sairá bem mais barato (oh, novidade…) incluindo corte de custos, justamente, no marketing e publicidade, além de desonerar um pouco a produção e o processo de fabricação dos discos. O projeto inicial da Warner é lançar a nova gravadora ainda este ano, provavelmente em dezembro, mas analistas da indústria fonográfica acreditam que certamente poderá haver um pequeno atraso, adiando para o início de 2006.

Mais do mesmo –

A “nova” gravadora da Warner é esperada com entusiasmo, porém, com dose similar de ceticismo. À primeira vista, pode soar como vanguardista, pioneira, mas na verdade é apenas um socorro desesperado para não perder o bonde da história – e dos lucros – em situação enfrentada por todas as gravadoras multinacionais, sem exceção.

A pseudo-concorrrente Universal, por exemplo, também tem uma gravadora exclusivamente digital desde o final de 2004. Mesmo revelando publicamente um bom retorno financeiro, os resultados ainda são pífios quando comparados a uma série de outras iniciativas independentes para distribuir e vender música.

Os próprios artistas estão começando a se cansar da morosidade das gravadoras em acordar à realidade, já tão discutida aqui na coluna, em tantas oportunidades, que o modelo atual de venda e distribuição está falido. Funciona em determinados locais, onde você não vai encontrar cidades e urbanóides conectados à Internet.

No entanto, é nas cidades onde reside a população mais economicamente ativa, ou seja, aqueles que realmente dispõem de recursos financeiros extras para comprar supérfluos (entretenimento) todo mês. Estas pessoas não agüentam mais chegar às lojas e ver um CD por 30 reais. O preço não é o único fator negativo, talvez apenas o principal. Nos dias atuais, o fato de a gravadora querer impor as faixas que você irá ouvir, mesmo quando só gosta de uma ou duas canções, é outra bola fora na opinião dos consumidores.

Artistas e bandas mais antenados, que valorizam primeiro o trabalho intelectual para só então pensar em meios de ganhar mais dinheiro, deram início a uma empreitada bem interessante. Essas bandas estão colocando na Web as gravações, feitas por eles mesmos, de shows ao vivo e canções que ficam fora dos discos oficiais da gravadora. Claro, quando o contrato (com as gravadoras) permite.

Os chamados ‘bootlegs’, também já discutidos aqui na coluna, são grandes vedetes na Internet há pelo menos uma década. São álbuns não-oficiais, os quais você não irá encontrar em loja alguma no mundo, nem mesmo nos arquivos das gravadoras. Até pouco tempo atrás, os bootlegs eram gravados e “produzidos” pelos fãs, que iam aos shows, gravavam e depois, em casa, adicionavam filtros de áudio para limpar ruídos. Os downloads na Internet pipocavam.

Hoje, contudo, os bootlegs estão cada vez mais profissionais, muitas vezes com qualidade quase igual ou idêntica aos álbuns oficiais. Um dos motivos é que há bootlegs gravados pelas próprias bandas, propositalmente. Algumas revelam o jogo e colocam nos sites oficiais para download, enquanto outras preferem fazer no anonimato e, também de forma anônima, colocar na Internet para os fãs ouvirem e novos ouvintes conhecerem a banda e as músicas.

Pearl Jam é um dos exemplos de bootlegs oficiais, lançando uma loja virtual para vender gravações da nova tour. Boa parte dos shows ao vivo realizados este ano também vão ficar online para download e/ou compra. A banda ainda planeja disponibilizar shows clássicos, em breve.

Contrariando o senso comum, o Brasil não está no fim da fila. Muito pelo contrário, é aqui no País onde encontramos as iniciativas independentes mais interessantes, algumas das quais estão fazendo história e fazendo seguidores mundo afora. Alguns dos movimentos mais independentes já vimos em colunas anteriores, mas na próxima iremos tratar de novidades bem interessantes. As grandes gravadoras têm muito o que aprender.

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