Paulo Rebêlo
Revista Backstage
novembro 2005
Sempre considerado vilão, o MP3 também pode ser o centro de inovação e novas possibilidades comerciais para empresas e gravadoras com um mínimo de visão mercadológica. Um bom exemplo foi feito pela Trama, que deixou de lado o discurso padrão e pasteurizado das gravadoras e resolveu colocar no mercado um CD comercial recheado de músicas no formato MP3.
É uma proposta diferente de montar um site para vender músicas online. Primeiro, é válido realçar que é enorme o universo de pessoas que sequer imaginam o que seja MP3. Segundo, mesmo para aquelas com familiaridade, pode parecer complicado à primeira vista pagar por um disco com músicas digitais para escutar no computador – até porque os aparelhos convencionais de som com suporte ao MP3 ainda são caros e restritos.
O disco da Trama – Volume 1 – foi uma coletânea com 100 músicas de artistas filiados, em tiragem de 5 mil cópias. Conta com as marcas Tom Zé, Max de Castro, Rappin Hood, Fernanda Porto e vários outros, somando boas sete horas de músicas ao custo de R$ 48, contras os tradicionais 50 minutos (quando muito!) do CD nacional padrão.
A inteligente sacada da Trama, independentemente do volume de vendas, é levar ao comércio e apresentar a todos os possíveis compradores, mesmo aqueles que não conheçam o MP3, o bom e velho hábito de montar coletâneas como se fazia antigamente com as fitas K7. Lembro como se fosse hoje das saladas musicais que aquelas fitinhas guardavam, depois de horas e horas de gravação caseira. A salada mista em versão digital atrai a enorme quantidade de usuários que não têm banda larga (Internet em alta velocidade) em casa ou aqueles que, simplesmente, não têm mais paciência de ficar horas procurando e baixando as músicas pela Web.
Ao dividir o valor de cada música por R$ 48, chegamos a um custo (para o consumidor) de R$ 0,50 por faixa. Em termos comparativos, é bem menor do que o preço cobrado pelo iTunes de R$ 2,30. E é porque o iTunes é o serviço de música online legalizada mais popular e que deu mais certo, sendo até mesmo considerado, por muitos, como o pontapé inicial para acordar as grandes gravadoras ao fato que é preciso mais investimento e dedicação nas lojas online.
Iniciativa não é pioneira
Apesar de louvável e inovadora, é bom avisar que colocar CDs com MP3 dentro da lei no mercado brasileiro não é uma iniciativa pioneira e exclusiva da Trama. A vantagem da gravadora é a visibilidade. Hoje, a Trama não é apenas bastante conhecida como, também, bem respeitada e admirada no mercado fonográfico.
Para quem admira (?) a música gospel, o selo MK Publicitá já lançou um CD com músicas religiosas no formato MP3, antes mesmo da Trama. Sem contar que, nas regiões Norte e Nordeste, é comum encontrar artistas vendendo seus próprios CDs em MP3, geralmente os menos conhecidos, sem contratos com gravadoras.
Por conta dos recursos, outra vantagem da Trama é a adoção de vários formatos. Em recente entrevista a jornais brasileiros, o presidente da gravadora, João Marcello Bôscolli, explicou que a Trama trabalha com CD normal, CD-single, CD MP3, CD em envelope de papelão e músicas para download na internet. Ele explicou que não pretende lidar com o DualDisc – formato já visto aqui na coluna da Backstage – mas pensa em liberar títulos em Super Audio CD (SACD), uma espécie de concorrente do DVD Audio.
iTunes e preços
O valor médio de R$ 2,30 cobrado pelo iTunes pode parecer caro para o brasileiro, mas é bem barato para os americanos que pagam em dólar. No Brasil, as lojas de música online vendem as faixas a um custo variável, mas sempre entre R$ 1,99 e R$ 2,99. Até no costume dos “noventa e nove centavos” a gente tenta imitar os americanos, é incrível.
Um dos idealizadores do iTunes, o próprio presidente da Apple, Steve Jobs, já foi a público mais de uma vez para criticar a ganância das grandes gravadoras. Evidentemente, os engravatados não gostaram e repercutiram, a começar pelo presidente da Warner Music, Edgar Bronfam, quando disse que os preços praticados pelo iTunes são injustos e servem para quebrar o mercado. Mercado infeliz das gravadoras, só se for… Mas, elas estão aprendendo. Mais detalhes na próxima coluna.