Presidente socorreu Eduardo Campos ao questionar os profissionais de saúde que com movimento grevista prejudicam a população
Paulo Rebêlo
Diario de Pernambuco – 05.set.2008
Petrolina – Sem verbalizar o nome do estado de Pernambuco, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criticou abertamente o movimento grevista dos médicos. De modo contundente e quase aos gritos, deixou a modéstia de lado ao se considerar o melhor sindicalista do Brasil nos anos 70, mas que “sempre teve dúvida sobre greve de médico e de metrô, porque quem paga a conta é o mais pobre”. A crítica direta foi o auge do evento de inauguração do campus da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), ontem à tarde, em Petrolina. O presidente discursou após o governador Eduardo Campos (PSB), que não fez referência à crise na saúde.
Pouco antes, às 14h, Lula e uma extensa comitiva de convidados visitaram as instalações do novo Hospital de Urgência e Traumas, construído com 90% de recursos federais e o restante da prefeitura. A inauguração da unidade deve ocorrer em 23 de setembro. Após a visita, estudantes, curiosos e militâncias aguardavam o presidente já nas dependências da Univasf. O presidente subiu ao palco por último, acompanhado de Eduardo Campos, da ministra Dilma Roussef, do prefeito de Petrolina Odacy Amorim (PSB) e do governador da Bahia, Jaques Wagner (PT).
Odacy Amorim agradeceu, rapidamente, a presença do visitante ilustre e agradeceu a série de investimentos do governo federal no Nordeste. O prefeito fez questão de agradecer a ajuda de Humberto Costa (PT), atual Secretário das Cidades na gestão estadual. “Ele teve uma participação muito importante na liberação de recursos”, frisou, para em seguida sentar-se ao lado do prefeito João Paulo.
Antes de criticar abertamente a crise na saúde pela qual passa Pernambuco, o presidente Lula “vazou” várias indiretas à classe. Reclamou dos profissionais que se formam às custas do estado e não retribuem. “Tem gente que ganha uma bolsa e vai fazer especialização em Londres, depois ganha outra e vai para Berlim. Tem gente que vive de bolsa, acreditem!”, ironizou, conclamando aos estudantes que não deixem de retribuir à população o que aprenderam. Incisivo, atacou quem “criticou o ProUni, porque hoje os melhores alunos são do ProUni, aqueles que não tiveram a mesma oportunidade dos filhos de famílias mais abastadas”.
Lula antecipou que a meta é acabar com o vestibular, ao citar o exemplo do município de Santo André, onde os alunos com 90% de acertos no Enem podem entrar direto na universidade. Ao falar sobre a descoberta da camada pré-sal de petróleo, elogiou os engenheiros e pesquisadores brasileiros. “Com o dinheiro do petróleo, vamos formar milhões de jovens”, enfatizando o papel dos “profissionais da Petrobras”, em referência clara às polêmicas que envolvem uma possível criação de outra estatal para gerenciar as descobertas no setor.
No palco, estavam os deputados federais Maurício Rands, Ana Arraes, Inocêncio Oliveira, Pedro Eugênio e Sílvio Costa. Nenhum discursou. Também presentes os ministros José Múcio e Dilma Roussef, o Secretário Estadual de Desenvolvimento Econômico, Fernando Bezerra; Ronaldo Mota, representando o Ministério da Educação. Amanhã, Lulavai participar do corte de chapas simbólico no estaleiro Atlântico Sul e da comemoração dos 100 anos de Josué de Castro na UFPE.
Simepe contesta declarações
O diretor do Sindicato dos Médicos de Pernambuco (Simepe), José Tenório, mostrou-se surpreso com as declarações do presidente Lula sobre o movimento que a categoria realiza no estado em prol de melhores salários e condições de trabalho. “Estranho um presidente que já foi sindicalista, e como sindicalista chegou à presidência, dizer uma coisa dessa”, afirmou. Tenório esclareceu, ainda, que a categoria não decretou greve. “O que estamos fazendo é um movimento demissionário”.
No discurso que fez em Petrolina, Lula condenou a deflagração de greves em setores essenciais, afirmando que a maior vítima desse tipo de manifestação é o povo. O petista também criticou a falta de tato em negociações salariais dos dirigentes sindicais. “Além do mais, os estudantes se formam e não retribuem nada ao governo”, complementou o presidente.
José Tenório, no entanto, reforçou a tese de que os médicos estão promovendo um movimento legal e preocupado em não trazer prejuízo para a população. “O pessoal está insatisfeito e não vai continuar enfrentando essa situação. Não temos condições de trabalho”, observou. Apesar da declaração do diretor do Simepe, a crise na saúde agravou o atendimento nas grandes emergências do estado com a decisão dos médicos de não comparecer ao trabalho. Além disso, existe a possibilidade da decretação de greve dos 23,5 mil servidores da saúde. A categoria é contra o processo de criação da Fundação Estatal para gerir a saúde em Pernambuco.
O cobiçado espaço junto ao presidente
O candidato governista em Petrolina, Gonzaga Patriota (PSB), não esteve presente nos eventos de ontem, mas foi receber o presidente no aeroporto. Por outro lado, quem discretamente roubou a cena foi seu adversário, Júlio Lóssio (PMDB). Fora da comitiva e, segundo sua agenda oficial, Lóssio não havia programado ir à inauguração da Univasf na presença do presidente Lula. No entanto, resolveu aparecer em meio ao aglomerado de pessoas, embaixo do palco, que também esperava pela chegada do presidente.
Lóssio, que é médico e estreante na política, cumprimentou vários dos presentes, perdendo-se de vista logo depois. Em entrevista ao Diario, dias antes da chegada de Lula, Lóssio lembrou que o “PMDB também faz parte da base aliada do governo federal em Brasília, inclusive, com mais ministérios do que outros partidos na disputa”.
Patriota foi recepcionar o presidente no aeroporto. Em nota oficial de sua equipe de campanha, o socialista garante que Lula aproveitou a ocasião para reforçar o apoio à sua candidatura. “Gonzaga, sem sombra de dúvida, é a melhor opção para Petrolina. Para uma Petrolina Melhor e principalmente, para a continuidade de minhas ações”, diz a nota oficial. A imprensa não teve acesso a Lula no aeroporto e na visita ao novo hospital.
Durante o evento, não houve conotação política na esfera local e nem referências às eleições municipais. O prefeito João Paulo, cabisbaixo e com aspecto cansado durante todo o decorrer dos discursos, não falou e nem concedeu entrevistas.
Patriota foi escolhido candidato pelo PSB após processo de convenção partidária. Ele disputou a escolha com o atual prefeito de Petrolina, Odacy Amorim (PSB), que também queria concorrer. Odacy assumiu a prefeitura quando o prefeito eleito em 2004, Fernando Bezerra, assumiu a pasta de Desenvolvimento Econômico no governo estadual. Nos eventos de campanha, Patriota insiste na vinculação e no bom relacionamento entre ele e Odacy, enaltecendo as obras realizadas pela prefeitura e pelo governo federal.
Obras dinamizam saúde e educação
Ao falar sobre a Univasf, o presidente Lula lembrou que não cursou uma universidade, tendo apenas o curso técnico de torneiro mecânico. “O Brasil já teve tantos doutores, tanta gente fina governando o país. Quero que os filhos deste país tenham a oportunidade que eu não tive”, bradou, para delírio da platéia de estudantes.
O Hospital de Urgências e Traumas (HUT), em Petrolina, prevê o funcionamento de 154 leitos, 30 UTIs e seis salas cirúrgicas. Segundo o prefeito Odacy Amorim (PSB), a abertura oficial será em 23 de setembro. Já a Universidade do Vale do São Francisco (Univasf), funciona oficialmente há mais de um ano, mas só agora houve a inauguração.
Segundo o Ministro da Saúde, José Gomes Temporão, as duas obras representam uma iniciativa inédita no Brasil, ao integrar serviços e recursos entre os estados. Para a Univasf, a meta é atrair estudantes sobretudo de Petrolina, Juazeiro (BA) e São Raimundo Nonato (PI). “A integração entre universidade e hospital irá gerar ensino e atendimento de qualidade para todos”, disse.
Para a ministra Dilma Roussef, os investimentos no Nordeste são “extremamente significativos” e fazem parte de um conjunto de grandes obras, o qual inclui ainda a Transnordestina, duas siderúrgicas, uma refinaria, a revitalização do Rio São Francisco, entre outras”, pontuou. A ministra garantiu que, com a revitalização do rio, os nordestinos terão saneamento e água tratada.
O hospital funcionará com atendimentos de alta complexidade nas áreas de traumaortopedia e neurocirurgia, também recebendo as urgências encaminhadas pelo Samu via central de leitos, clínica médica, UTI adulto, queimados e cirurgia geral. A regulação deverá ser feita pelos médicos das Unidades de Pronto Atendimento de Saúde (UPAS), Unidades de Saúde da Família (USFs) e municípios parceiros.