Deputados faltam a 25% das sessões

LEGISLATIVO // Levantamento da ONG Transparência Brasil revela que Assembléia lidera ausências entre as Casas que divulgam a freqüência

Paulo Rebêlo
Diario de Pernambuco – 06.jan.2008

Passado um ano do levantamento realizado pelo Diario sobre as ausências dos deputados nas sessões da Assembléia Legislativa de Pernambuco (Alepe), a virada de 2007 revela pouca mudança no comportamento. Dentre as (poucas) casas parlamentares brasileiras que disponibilizam a ata de presença na internet para consulta, a de Pernambuco é líder com índice de 25% de faltas. Em segundo lugar vem a de Sergipe (21%), seguida por Rio Grande do Sul (12%), a Câmara dos Deputados (12%) e o legislativo estadual do Rio de Janeiro (5%). Os dados são filtrados pelo Projeto Excelências, da ONG Transparência Brasil. Os números específicos sobre Pernambuco, com o ranking completo, foi atualizado no final de dezembro a pedido do Diario.

A atualização da base de dados ocorre porque, pelo regimento interno da Alepe, os deputados devem comparecer apenas às sessões ordinárias e extraordinárias. Outras sessões, como as solenes, não exigem presença obrigatória. Logo, a metodologia de computar as faltastotais induz o cidadão a erro, já que parte dos deputados é assídua apenas nas sessões obrigatórias, por exemplo. Enquanto outros, nem isso. No entanto, apesar do detalhado ranking da Transparência Brasil, na prática a ausência real dos deputados é um nó cego, pois o regimento também permite exceções como as chamadas “missões culturais” e atividades de “interesse pessoal”.


Funcionam como permissão ou licença para que o parlamentar tenha a falta abonada e eventualmente represente o estado em eventos institucionais e culturais. Somando as faltas justificadas e não-justificadas, grande número de deputados não comparece a quase metade de todas as sessões do ano inteiro.

Salvo raras exceções, os deputados ouvidos pelo Diario enfatizam a legitimidade de poder faltar em determinadas ocasiões, seja para realizar atividades em suas bases eleitorais ou para representar o estado em eventos. A deputada Ceça Ribeiro (9º lugar no ranking) alega que falta às sessões porque “faz a ponte entre o governo estadual, federal e instituições, além de ouvir as necessidades da sociedade pernambucana, além de presidir a comissão de defesa do meio ambiente, uma das mais atuantes da Casa”.

Já o deputado Soldado Moisés (16º lugar) garante que todas suas faltas são justificadas, restando apenas as licenças em “missão cultural”. Neste caso, um levantamento da própria Assistência Legislativa a pedido do Diario mostra que, de fato, o deputado não possui falta sem justificativa computada no sistema: tem 98 presenças e 45 ausências em “missão cultural”. Elias Lira (DEM) tem 84 presenças e 57 ausências em missão, por exemplo.

João Negromonte (PMDB), que divide o 1º lugar no ranking das faltas de acordo com a Transparência Brasil, revela que precisou se ausentar por um tempo em licença médica, para tratamento de saúde. Vale salientar que, em todos os casos – licença médica, missão cultural ou atividades de interesse pessoal – o registro é feito no Diário Oficial.

No balanço da Transparência Brasil para 2007, os cinco mais faltosos são Lourival Simões (PR), João Negromonte (PMDB), Elina Carneiro (PSB), Elias Lira (DEM), Marcantônio Dourado (PTB). Os mais assíduos são Clodoaldo Magalhães (PTB) Aglailson Júnior (PSB), Eriberto Medeiros (PTC), Esmeraldo Santos (PR) e José Queiroz (PDT).

Mistério no desconto do contracheque

O regimento interno da Assembléia prevê, além da perda do mandato em casos de faltas excessivas, uma contrapartida financeira da ordem de 1/30 do subsídio mensal. Os deputados ganham um salário bruto de R$ 12,5 mil, sem contar as verbas de gabinete e outros auxílios. Na prática, contudo, ganha um doce quem encontrar o referido desconto nos contracheques dos parlamentares. Não há informações disponíveis ao público sobre os supostos cortes realizados.

Questionado pelo Diario, o presidente da Alepe, deputado Guilherme Uchôa (PDT), mostrou-se cético sobre qualquer tipo de lista com ausências dos deputados, mas garantiu que o regimento é cumprido. O presidente chegou, inclusive, a propor que “entregaria uma cópia de seu contracheque”, a qual foi prontamente aceita pelo Diario. Procurado pela reportagem durante mais de duas semanas por meio da assessoria da Alepe, não houve retorno. Outros deputados também procurados pela reportagem sobre uma cópia do contracheque também não mostraram interesse em contribuir.

Na Câmara dos Vereadores do Recife, a lista pública de presença também pode ser conferida pela internet, mas com uma sistemática um pouco diferente. O documento mostra os vereadores presentes e, no caso dos ausentes, limita-se a tipificar como “licença médica” ou “justificada”, sem maiores detalhes. No Congresso Nacional, o ano de 2007 também passa como um dos períodos com maior número de faltas de deputados, de acordo com o levantamento realizado em dezembro pelo site Congresso em Foco.

Fantasmas rondam a Alepe

Nos corredores da Alepe, o balanço de faltas divulgado pela Transparência Brasil não ecoa, chegando inclusive a ser tratado com certa ironia por alguns parlamentares. Na seara de críticas, porém, há constatações interessantes. Uma das mais incisivas parte da deputada Carla Lapa (PSB), ao afirmar que vários deputados “que todo mundo sabe quem são” nunca estão presentes nas sessões, mas os nomes não aparecem “nessas listas”, retruca. Ela não é a única. Outros parlamentares ouvidos pelo Diario expuseram a mesma constatação, mas nenhum aceita dizer quais são. “É injusto que haja esse tipo de apadrinhamento lá dentro, até hoje não tive uma posição da Mesa Diretora”, explica Lapa, referindo-se a uma reclamação, formalizada em agosto, por ela mesmo.

Embora reclame da metodologia aplicada nos levantamentos de faltas, Carla Lapa é uma das que não dá crédito a questão da ausência parlamentar. “Acho a discussão uma coisa pequena, nunca me preocupei porque sempre me fiz muito presente, tenho plena consciência”, explica.Ela admite, contudo, não ter comparecido (e não ter justificado) às sessões das segundas-feiras, até agosto de 2007, porque não há votação e porque ela permanece em seu gabinete, trabalhando.

No ranking levantado pelo Diario referente a 2006, os cinco mais faltosos foram Carla Lapa (PSB), Ana Rodovalho (PRTB), Malba Lucena (PTB), Betinho Gomes (PPS), Claudiano Martins (PSDB) e Fernando Lupa (PSDB). Deste grupo só Lapa e Martins se reelegeram. Este ano, Lapa figura na 13º posição. De acordo com a Assistência Legislativa da Alepe, setor responsável por computar as faltas dos deputados, o processo é simples: ao entrar no plenário, um funcionário do setor registra a presença. Os requerimentos de licença precisam ser aprovados pela presidência da Casa e enviados para a Assistência. Em seguida, os números são disponibilizados no site oficial da Alepe (www.alepe.pe.gov.br) e a direção do setor garante que o processo é transparente e que, até hoje, não recebeu reclamações formais dos deputados sobre as presenças “fantasmas” que não são computadas.