A força eleitoral do pós-assistencialismo

SOCIAL // Lançado no Agreste, programa Territórios da Cidadania destina 70% dos recursos para regiões sob comando de aliados

Paulo Rebêlo
Diario de Pernambuco – 18.maio.2008

Dinheiro não cai do céu, mas receber uma quantia fixa todo mês, sem contrapartidas e sem critérios passíveis de fiscalização concreta por parte do poder público é quase uma ajuda divina. Logo, não chega a surpreender que até as eleições de outubro se acentue o destaque ao Territórios da Cidadania. Espécie de evolução conceitual do Bolsa Família, o programa entra na pauta de quase todos os políticos aliados do presidente Lula e faz tremer as bases da oposição. Na sexta-feira (16), novamente o Territórios foi lançado, agora em Pernambuco, com a presença do governador Eduardo Campos, secretários estaduais, representantes do Planalto, prefeitos e parlamentares.

Das 60 regiões cobertas pelo “novo” programa, 44 estão sob o comando de governadores da base aliada. Juntos, eles devem receber quase R$ 8 bilhões somente este ano, o que representa pouco mais de 70% do total de recursos previstos. Criticado por todos os lados devido ao caráter assistencialista, o Bolsa Família começa, aospoucos, a ceder espaço para o Territórios, pelo qual se pretende desenvolver a infra-estrutura de rincões do Brasil – implantando saneamento básico, energia elétrica e outras ações.

Não à toa, tanto a oposição quanto a maioria dos analistas políticos concordam que, enquanto o Bolsa Família existir, o presidente Lula e qualquer candidato apoiado por ele ganham fácil qualquer eleição no Nordeste. Desta vez, o governador Eduardo Campos e sua comitiva partiram rumo ao Agreste Meridional, a fim de cumprir agenda nas cidades de Garanhuns e Caetés, onde participaram de mais um lançamento.

O pré-candidato do DEM à prefeitura do Recife, Mendonça Filho, é um exemplo interessante. Ele já antecipou que durante o seminário “Realidade Social no Recife e Políticas Sociais”, a ser realizado nesta segunda-feira (19) no Sebrae, irá reafirmar o apoio integral ao Bolsa Família. O prefeiturável acusa o PT de espalhar boatos nas comunidades dizendo que ele vai acabar com o programa. Em todos os seus discursos pelos bairros, Mendonça defende com peculiar altivez que não irá mexer no benefício caso seja eleito. Não é o único. Os pré-candidatos Brasil afora usam as críticas dos partidos da oposição como moeda eleitoral, até mesmo insinuando que os “outros” irão acabar com o Bolsa Família.

Orçamento – No total, o Territórios da Cidadania engloba 135 ações, das quais nenhuma é nova. Espalhadas por 15 ministérios e direcionadas a 958 municípios brasileiros, os recursos financeiros já fazem parte dos orçamentos dos ministérios, aprovados há bastante tempo, mas agora com nova maquiagem. Para este ano, são R$ 11,3 bilhões previstos. O Pará, da governadora Ana Júlia (PT), é o estado que mais receberá recursos (R$ 1,2 bilhão), seguido pela Bahia (R$ 1 bilhão) de Jaques Wagner (PT).

Programa atenua desigualdades

O economista José Márcio Camargo, um dos primeiros a formular a proposta de renda mínima que supostamente deu origem ao programa, irá falar sobre o assunto na TV Câmara, neste domingo, às 20h. Professor da PUC do Rio de Janeiro e doutor pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos, ele reconhece publicamente que já foi criticado por setores do próprio PT por ter idéias “consideradas neoliberais”, ao mesmo tempo em que economistas da ala liberal costumam ver com desconfiança suas preocupações sociais.

São 11,1 milhões de famílias beneficiadas pelo Bolsa Família no Brasil, das quais quase metade estão na Região Nordeste e 1,1 milhão em Pernambuco. Exemplos como o município de Pombos, no Agreste, onde as famílias são direcionadas a aplicar o dinheiro do programa em ações auto-sustentáveis, infelizmente ainda são pequenas exceções pelo país. O caso foi abordado pelo Diario na edição do dia 2 de março deste ano.

Renda – O economista alagoano Cícero Péricles de Carvalho, um das maiores estudiosos sobre os impactos do Bolsa Família, garante que sem esses programas a situação da maioria dos estados seria ainda pior do que é hoje. Professor na Universidade Federal de Alagoas, ele realça que são 350 mil famílias atendidas naquele estado. “É o maior número proporcional do Brasil”, esclarece. Um estudo deste ano do Centro Internacional da Pobreza, vinculado à ONU e ao Ipea, mostrou que aumentar o benefício ou o número de atendidos nos programas de transferência ajuda a derrubar a desigualdade de renda.