2046 retalha passado, presente e futuro

Paulo Rebêlo
Revista Pipoca Moderna / dezembro.2005

A edição de 2004 do Festival de Cannes atrasou sua programação só para exibir a estréia de “2046”, ainda em versão não-finalizada. O filme de Wong Kar Wai também abriu salas de cinema nos Estados Unidos com pompas elogiosas dos críticos de arte e, no Brasil, passou em festivais com excelentes resenhas na imprensa. “2046” tem muitos méritos, é lindo, poético e majestosamente interpretado por seus protagonistas, mas é para poucos. Talvez por isso chegue só agora ao cinema no país. Complicado e retalhado, às vezes peca pelo excesso de mistura entre a realidade e o imaginário, desnorteando o espectador.

Tony Leung Chiu Wan (de “Herói” e “Conflitos Internos”) é um jornalista/escritor que retorna a Hong Kong para finalizar um romance, achando que está escrevendo uma obra futurista quando, na verdade, trata-se do passado. Em suas lembranças e frustrações, segue uma jornada de relações com quatro mulheres em períodos diferentes no quarto 2046, que também é o título do livro. A trama retoma o tema e o personagem do clássico “Amor à Flor da Pele”, vivido por Leung em 2000, e também marca o retorno de Gong Li às superproduções e aos olhos do Ocidente, após um longo período fazendo filmes menores na Ásia.

Gong Li é aquela atriz de “Lanternas Vermelhas” (1991), “A História de Qiu Ju” (1992) e “Adeus, Minha Concubina” (1993), que durante uma década foi musa do cinema chinês. Ela compartilha a trama com a nova sensação feminina, a bela Zhang Ziyi (de “O Clã das Adagas Voadoras” e “Herói”) que, inclusive, é justamente considerada a “nova” Gong Li na China, diante do carismo e do sucesso de seus filmes em todos os continentes.As duas ainda poderão ser vistas no mês que vem em “Memórias de uma Gueixa”.

O ponto forte de “2046” é, sem dúvida, a direção de Wong Kar Wai, diretor cultuado não apenas na Ásia, mas queridinho de várias atrizes de Hollywood, como Nicole Kidman, que se oferecem abertamente para um dia filmar com ele. Não à toa, Kar Wai é o diretor com a maior quantidade de filmes (seis, no total) selecionados entre os “100 Melhores Filmes Chineses em 100 anos” da Hong Kong Film Awards. Todos filmados entre 1989 e 2000. Kar Wai também foi o primeiro chinês a faturar o prêmio de melhor diretor no Festival de Cannes, em 1997.

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