Parei de escrever com medo de me entender

Parei um pouco de escrever. Não sei bem por onde recomeçar, mas lembro bem quando começou a terminar.

Nunca escrevi tão pouco em toda minha vida. Ao menos sobre o que gostaria de escrever. Foram apenas duas crônicas em 2018, três em 2019.

Fui conferir no arquivão: 187 crônicas publicadas do ano 2000 ao 2019. Dá uma média de 9,3 por ano.

É pouco, muito pouco mesmo.

Meu bloco de anotações, que no passado eram guardanapos rabiscados na mesa do bar, hoje é um calhamaço digital no celular com mais de 200 entradas. E aparentemente nenhuma saída.

São pequenas notas, frases de lembrete, observações imediatas, parágrafos inteiros para escrever novas, ou melhor, velhas crônicas.

Engraçado como o medo de escrever acomete as pessoas que escrevem.

Talvez não seja medo, apenas receio. E talvez não seja de escrever, apenas de publicar para o mundo.

Porque sempre vai ter alguém do outro lado para ler. Não faz diferença se é apenas uma pessoa ou cem pessoas. Ou milhares de cliques aleatórios e visitantes anônimos que chegam diariamente por aqui a partir de pesquisas no Google com os corações rasgados e relacionamentos frustrados.

Às vezes a gente quer que muitas pessoas interpretem nossos caracteres, outras vezes queremos que apenas uma pessoa consiga entender um pedaço do que escrevemos.

Na maioria das vezes, porém, eu não quero nada de ninguém.

Quero apenas colocar para rua as toneladas de sentimentos e observações da minha própria estrada. Pesos de um lado e levezas de outro, acumulados com esse tempo desgraçado que passa mais rápido do que um trem-bala sem freios e sem destino.

É uma expectativa improvável, para não dizer impossível. Ninguém escreve para ninguém ler.

Mas queria tentar mesmo assim.

Embora eu não saiba por onde recomeçar, acho que aprendi a não deixar terminar de novo.

Ao menos enquanto o tempo me deixar.


Foto em destaque:
As mãos de um poeta tocador de pífano.
Piaçabuçu, Alagoas, Brasil — março de 2009.
Nikon D90 | 70mm | 1/60 | f/5.3 | ISO 800

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