Os filmes que ela não viu

Paulo Rebêlo
NE10/JC | 04.ago.2014 | link

Deixei de assistir excelentes filmes, sobretudo os clássicos, porque guardava para assistir com ela. Antes, não sobrava tempo. Depois, não sobrou ela.

A lista foi crescendo e assisti outros filmes igualmente excelentes: asiáticos, nórdicos, russos e de vários países estranhos.

Por causa da lista, também vi quase todos os filmes ruins que o mundo teve notícia.

Quando outras moças queriam assistir a um lançamento ou a sensação da época, eu precisava inventar alguma desculpa para não ir ao cinema ou não alugar a fita em videocassete. Filme bom ia para lista de espera.

Veio a internet e me criou um problema adicional: as legendas.

Colecionar filme ficou fácil e tenho o maior ciúme dos meus achados inóspitos em terras estranhas. As legendas em português para essas relíquias, porém, são quase impossíveis de encontrar.

Esse detalhe também fez aumentar a lista, já que voltei a assistir sozinho os filmes sem legenda e guardar os outros.

Os anos passaram e a lista sumiu. Devo ter queimado no fogo com enxofre e sal grosso, talvez depois de duas garrafas de Natu Nobilis. Difícil lembrar.

É que o filme costuma ser o mesmo, mas a experiência e a lembrança podem ser bem diferentes.

Se eu tivesse guardado a lista, não teria visto pela segunda vez Hana-Bi, anos atrás. Assisti pela primeira vez em 1998, na Fundação Joaquim Nabuco.

Agora surgiu esse tal de Netflix e me criou outro problema. O botão “salvar para ver depois” parece ilimitado.

Foi quando percebi que já não conseguia mais lembrar dos filmes que poderia ter visto e não vi.

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