Os novos donzelos

Terra Magazine – abril.2010

Dia desses, pediram minha opinião profissional sobre uma dúvida muito complexa: como ganhar dinheiro fazendo um site de mulheres sem sacanagem?

Não tem mistério. É só colocar sacanagem.

Vai chover de mané com cartão de crédito. Porque de todas as mazelas que o computador nos trouxe, poucas superam o surgimento desta nova classe de donzelos conectados.

Eles conseguem até telefone de garota de programa pela internet, veja que maravilha.

Lógico, somente depois de conferir fotos em alta resolução que elas enviam por e-mail pelo notebook baratinho da Positivo que elas ganharam de presente de um cliente.

Tudo muito higiênico e seguro, sem perigo de esbarrar em cafetão. Lascívia delivery. Com desconto e cartão infidelidade.

De passagem por São Paulo no feriadão, me escondo daquela chuva interminável debaixo da marquise na Augusta. Enquanto espero o táxi anfíbio, duas moças conversam em polvorosa.

A jovem donzela lamentava o fim do namoro. Não foi por ter pego o cônjuge na cama deles com uma sirigaita qualquer, como acontecia antes. Até porque hoje ninguém mais sabe o que é sirigaita.

Ela abriu o computador do donzelo e o site mais acessado era um tal de Bitch Maps. Fez as malas do coitado e chutou-lhe a bunda.

E ainda dizem que Bill Gates ajuda os pobres.

Não sei como surgiu, mas aparentemente vários donzelos se reuniram (online, claro) e inventaram a oitava maravilha do mundo para outros donzelos.

Trata-se de um sistema para mapear as casas de baixo meretrício e escrever resenhas sobre as profissionais e seus respectivos estabelecimentos.

Tudo gratuito, porque donzelo que se preze vive de mesada.

Como São Paulo é a capital dos donzelos e das mulheres solteiras que não encontram homens heteros ou interessantes (não necessariamente nesta ordem), não surpreende o sucesso da empreitada digital.

Não tenho raiva, tenho é inveja. Os donzelos mapearam até Londrina, mas deixaram Brasília fora do circuito.

Talvez porque o pessoal do Planalto Central esteja mais interessado em ganhar dinheiro ou desviar recursos públicos. Não sobra tempo para a luxúria localizada.

A maioria das mulheres que conheço por aqui só fala em trabalho, impostos a pagar e licitações a participar. Trepar que é bom, necas de pitibirebas.

Minha inveja dos novos donzelos é que, hoje em dia, tudo é muito fácil.

Eu ainda achava que sites de relacionamentos e aquele tenebroso bate-papo do UOL ainda fossem a última coca-cola do deserto, mas aparentemente estou um pouco démodé.

Antigamente, quem não tinha namorada (ou empregada) precisava chamar vários amigos para juntar as moedinhas. O mais corajoso fazia a coleta e pagava uma comissão para um vizinho maior de idade comprar a Playboy.

Não existe sequer um homem no Brasil que não tenha vendido almoço e janta para ver a Playboy da Luciana Vendramini, por exemplo.

Lembro de gente negociando com o próprio avô para decidir quem ia ficar (leia-se: rasgar e guardar) determinadas páginas da revista.

É por isso que até hoje tenho raiva do Paulo Ricardo, que acabou com o sonho de três gerações inteiras. Joguei todos meus discos do RPM no lixo.

A festa era simplesmente isso. Quando os hormônios começavam a apitar, a expressão “momentos de privacidade” não constava no dicionário de ninguém.

Fulano se trancava no banheiro, mas logo vinham os gritos da cozinha de que estava gastando água demais. Via de regra, sempre havia pelo menos cinco ou seis pessoas na fila de espera para tomar banho no único e minúsculo banheiro da casa.

Isso quando a porta tinha trinco. Do mato de onde venho, porta geralmente era luxo para poucos. Quando muito, colocavam um lençol ou uma cortina transparente e toda rasgada naquele vão onde, teoricamente, deveria ser uma porta.

Hoje, os novos donzelos se trancam num quarto que não precisam dividir com ninguém, fecham a janela, ligam o ar-condicionado e com dois cliques têm vídeos de alta definição pela internet e som Dolby Stereo Surround.

Se a mãe bater na porta, é capaz de ligarem para a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente e alegar maus tratos.

Depois, usam o iPhone para mapear os puteiros e o Skype para telefonar e chamar uma garota de programa universitária que, provavelmente, será mais bonita do que a mulher mais bonita que já conheci na vida.

Ela vai chegar com dois livros debaixo do braço e os dois vão se trancar no quarto para estudar.

Mais do que inveja, fico com pena mesmo é da empregada. Ela perdeu toda a importância na vida de um jovem mancebo.

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