Política de duas famílias

Em Angelim, cidade de João da Costa, os Salgado e Calado vêm se alternando no poder

Paulo Rebêlo
Diario de Pernambuco
24.agosto.2008

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ANGELIM, PE – Duas famílias rivais dominam o cenário político de Angelim, a 214 km do Recife, no agreste meridional. Os sobrenomes Salgado e Calado se alternam no poder desde os primórdios de Angelim e, no meio do tiroteio, uma figura inusitada: o candidato do PT a prefeito do Recife, João da Costa.

Nascido na cidade em 6 de novembro de 1960, é filho de João da Costa Bezerra, que já foi vereador, prefeito e presidente da Câmara Municipal. A família de João da Costa que ainda reside em Angelim, no entanto, não suporta ouvir sequer o nome do partido do filho ilustre, o PT. São adversários declarados do atual prefeito Samuel Salgado (PT), candidato à reeleição contra Marcos Calado (DEM).

O contexto político ganha ares novelescos quando se descobre, por exemplo, que foi o pai de João da Costa que lançou Marcos Calado na política. “Meu pai era político, meu avô era político, mas eu não quis saber de política e fui ser bancário. Só em 1988, com apoio e incentivo de João da Costa (pai) é que entrei e não saí mais”, diz Calado, ex-prefeito de Angelim entre 1997 e 2004.

Na campanha de 2004, não podendo concorrer novamente, lançou seu vice Josemir Miranda (PTdoB) contra Samuel Salgado, que ganhou a eleição com uma diferença de 123 votos. “A cidade é realmente dividida entre as duas famílias, mas durante um tempo éramos apenas adversários políticos, hoje tem muita gente que não fala mais comigo”, diz Salgado, com certa razão. Josemir Miranda, adversário em 2004, já foi vice-prefeito de Samuel Salgado quando ele ocupou a chefia do executivo entre 1982 e 1988. “Rompemos no ano seguinte por divergências políticas”, desconversa.

O atual prefeito conta com o apoio das máquinas estadual e federal por ser o candidato da situação. Os cartazes com a imagem clássica – reproduzida Pernambuco afora – de Eduardo Campos e Lula estão espalhados por toda parte. “Por conta da divisão entre famílias, o apoio deles é fundamental”, acredita o prefeito, com um acentuado zeloem relação ao apoio formal do governo.

Sobre a família de João da Costa, também desconversa. “Eles nunca nos apoiaram, sempre foi assim, a família é conservadora e esteve sempre com o PFL (atual DEM). Mas João da Costa é diferente, é nosso aliado político e surpreendeu a todos nas pesquisas de intenção de voto no Recife”, comemora discretamente.

Pesquisas – Nem mesmo a família de João da Costa acreditava que ele fosse crescer nas pesquisas – uma opinião abalizada por uma das tias do ex-secretário de planejamento, Dolores Bezerra da Costa, ainda residindo na cidade.

A tia Dolores lembra os tempos de adolescência do sobrinho. “Aqui ele é Joãozinho, é Janja; João da Costa é o pai, que faleceu em 2003”. Dolores faz questão de frisar que “Joãozinho” é de esquerda desde novo e nunca gostou do partido do pai. “Não votamos no PT, nem nesse candidato que está aí, ele vive mudando de partido e vai para onde o poder está. Apoiamos Joãozinho porque é do sangue, só por isso”, completa.

O candidato Marcos Calado não acredita que o apoio da família de João da Costa exerça tanta influência em sua campanha. “Nem Lula e nem Eduardo influenciam demais o eleitor em Angelim. E João da Costa menos ainda. Ele sempre foi completamente ausente daqui”, resume.

Prefeito confiante na vitória de João

O prefeito-candidato Samuel Salgado (PT) não esconde seu receio em relação às eleições do Recife. Entrevistado pelo Diario em janeiro deste ano, quando João da Costa ainda patinava nas pesquisas, mostrou-se cético em relação ao futuro político do PT na capital. “Competente ele é, bastante, é um excelente técnico. Mas apenas isso não ganha eleição, o partido reconhece que João da Costa não é um político tradicional”, disse.

Hoje, Salgado não apenas confia na vitória do aliado como pretende aprovar, na Câmara de Vereadores, um projeto para batizar com o nome do pai de João da Costa a primeira Academia das Cidades em Angelim. Ironias à parte, o prefeito garante que o pedido da homenagem partiu pessoalmente de Humberto Costa. Ambos são da Unidade na Luta, bloco interno do PT contrário ao do prefeito do Recife, João Paulo, e do próprio João da Costa. A inauguração deve ocorrer antes de outubro, segundo o prefeito, com a presença de Humberto, Secretário das Cidades no governo estadual.

O apoio dos figurões do PT noRecife também faz parte da agenda do atual prefeito contra o adversário Marcos Calado (DEM). “Não tem uma semana que conversei com João da Costa por telefone, ele quis saber quando seria o melhor momento para o prefeito João Paulo visitar Angelim”, alfineta. A visita do governador Eduardo Campos (PSB) e do Ministro de Relações Institucionais, José Múcio (PTB) era esperada para este final de semana em Angelim.

Mudança de lado

A presença emblemática e forte do pai de João da Costa, na direita expressa pelo PFL, não é encarada pelas tias de João da Costa como uma discórdia familiar. “O pai sempre respeitou as opções de Joãozinho. Incentivou que fosse buscar o que achava certo, tomar as rédeas da carreira”, garantiu Ivonete Bezerra, uma das tias que mora no Recife, em entrevista para a reportagem publicada no Diario em 27 de janeiro de 2008.

João da Costa Bezerra, o pai, não viu a reeleição de João Paulo (com João da Costa nos bastidores), nem o filho conquistar mandato de deputado estadual como terceiro mais votado em Pernambuco (65.240 votos) e o mais votado no Recife (42.998). O pai já era vereador quando João da Costa tinha apenas seis anos, em 1966. Toda a família sempre militou na direita, desde a época da Arena – que depois tornou-se PDS, em seguida PFL.

Pelas ruas de Angelim, o Diario reencontra também a primeira namorada de João da Costa, na época do ginásio. Hoje funcionária da prefeitura, não quer aparecer em foto, mas continua fã de carteirinha do hoje candidato à prefeitura do Recife. “Agora com internet, dá para acompanhar toda a campanha no Recife, né? É melhor do que recortar jornal”, brinca.