Informática: cuidado com a “lábia” do vendedor

Não existe coisa pior do que pagar caro para receber um produto defeituoso. Além da dor de cabeça e do estresse na hora de fazer a troca, há situações em que o cliente ainda enfrenta a má vontade da loja ou o despreparo dos vendedores. Na hora de comprar um micro novo, todo cuidado é pouco. Cientes de que nem sempre o comprador sabe o que está levando para casa, algumas lojas empurram peças defeituosas ou montam as peças de um modo que possam dar defeito com pouco tempo de uso. As dicas são simples: exigir nota fiscal, esclarecer a questão da garantia de todas os componentes do micro e, caso você não entenda nada de informática, procure um amigo ou parente que conheça o assunto para não cair na lábia dos vendedores.

Paulo Rebêlo

Um bom exemplo de como as lojas podem facilmente “enrolar” o consumidor é o que aconteceu na Universidade Federal de Pernambuco, no Setor de Informática da Pró-Reitoria para Assuntos de Pesquisa e Pós-Graduação (Propesq). O departamento precisava renovar os computadores e fazer upgrades em outros, mas terminou só tendo dores de cabeça. Após uma licitação pública, uma empresa que atua no Recife venceu a concorrência e ficou de entregar 15 máquinas novas. Em praticamente todas elas, havia pelo menos um defeito nas peças ou montagem errada dos componentes.

A equipe do suporte de informática da Propesq, coordenada por Marcelo Braga e Paulo de Souza, conseguiu identificar os problemas porque trabalham na área há bastante tempo. “O amadorismo da empresa foi tão grande que, talvez, nem tenham observado que se tratava de um setor de suporte técnico. E se fosse uma pessoa que não entende do assunto? Ia ficar no prejuízo e seria muito prejudicada”, desabafa Sousa. Segundo ele, há casos que beiram o absurdo, como a falta do cooler (ventilador) do processador e discos rígidos instalados sem o devido encaixe de parafusos, comprometendo a vida útil e até mesmo o funcionamento da peça.

Foram duas as empresas que venceram essa licitação na Propesq, mas o departamento optou por não divulgar o nome das empresas em questão, mas confirmou com documentos e notas para a reportagem. A Folha comprovou em arquivos de licitações públicas que as mesmas empresas já ganharam concorrências em outras instituições, em vários setores de informática. “As máquinas começaram a dar problema, os técnicos da loja vinham até aqui e ainda insinuavam que a gente estava inventando ou forçando os defeitos”, lembra Braga. “Sem contar na demora para entregar os equipamentos, sempre inventavam uma desculpa e demoraram meses para instalar,” complementa.

Para o técnico em informática, Admilton Júnior, a grande sacada para o usuário leigo é nunca comprar em lojas desconhecidas ou que não passem confiança, sobretudo no quesito garantia e assistência técnica. “Não é à toa que, de vez em quando, algumas lojas fecham as portas. Às vezes, o barato pode sair bem mais caro”, avisa. Outra dica do técnico é procurar sugestões e consultoria de um amigo ou parente que entenda mais do assunto, para evitar entrar em enrascadas. E se mesmo assim der tudo errado, uma alternativa é ir ao Procon e tentar resolver a confusão na Justiça. E esperar.

Problemas e defeitos são corriqueiros

Atire a primeira pedra quem nunca teve dor de cabeça com uma loja de informática. Qualquer componente eletrônico está sujeito a defeitos de fabricação ou até mesmo a instalações erradas por erro humano. No entanto, para a maioria dos usuários de informática, o difícil de engolir é quando fica visível que houve má-fé por parte de quem vende.

O desenvolvedor de aplicativos para Web, Josenildo Júnior, é um dos que sofreram com as falcatruas. Ele mesmo conta: “certa vez, gastei uma nota no computador novo e, em pouco tempo, a placa-mãe queimou por um motivo desconhecido. Estava na garantia, mas a loja disse que não tinha mais aquele modelo e só podia colocar outra placa se eu pagasse a diferença de preço, já que a nova era mais cara. Depois de muita confusão e vários dias de argumentação, aceitaram trocar a placa-mãe sem me cobrar nada,” explica, para em seguida complementar: “acontece que, ao fazer a troca, eles ficaram com a minha placa de som, que era muito boa, e instalaram o som onboard (embutido) da placamãe, de qualidade bem inferior. Acharam que eu não ia perceber”, diz.

O caso dele é apenas um, entre tantos conhecidos pelos técnicos. Ao reclamar, Josenildo recorda ainda que o vendedor quis ficar com a razão, dizendo que a loja guardou a placa de som sem avisá-lo para poder compensar a diferença de preço da placa-mãe trocada. Em outras situações, nota-se que o cliente sofre bastante apenas com o descaso das lojas. A jornalista Maria Verônica, por exemplo, precisou comprar um teclado em uma loja bem conhecida da cidade, mas o conector era diferente e não tinha o aviso em lugar algum da caixa. “Só depois de 15 dias é que aceitaram trocar, correu tudo bem, mas não havia a menor necessidade de colocarem tantos obstáculos para um erro que não foi do cliente”, analisa.

Quando não há solução, procure seus direitos

Renato Russo já cantava que, quando tudo está perdido, sempre existe uma luz. Nem sempre ela funciona como deveria, mas é um caminho que o usuário deve procurar: a Justiça. Se você tem certeza que está sendo enganado ou lesado financeiramente, procure o Procon. É importante lembrar que as lojas só são obrigadas a trocar as mercadorias que estiverem com defeito e o prazo é de 30 dias após a compra, de acordo com artigo 18 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor.

Nos outros casos, o que vale é a política de troca de cada estabelecimento. Daí ser tão importante certificar-se da garantia de cada peça, a fim de evitar surpresas desagradáveis no futuro. De acordo com técnicos e lojistas independentes consultados pela Folha, é comum as lojas afirmarem que o problema não é culpa delas ou que se trata de um defeito de fabricação. Se o problema não for resolvido em até 30 dias, o consumidor pode exigir qualquer uma destas três opções: a substituição do produto por outro similar e em perfeitas condições de uso; a restituição imediata da quantia paga ou o
abatimento proporcional do preço. De acordo com a direção do Procon-Recife, o consumidor deve comparecer à sede do órgão munido de toda a documentação referente ao caso: procuração, contrato, nota fiscal, recibo, ordem de serviço, carta de cobrança, orçamento, boleto bancário, propaganda ou qualquer outro material que possa servir como auxílio.

Após a abertura da reclamação, notifica-se a empresa para uma audiência de conciliação. Havendo acordo, as reclamações são arquivadas. Se não houver acordo, o caso continua e segue para a direção do Procon, restando duas alternativas: abrir o processo administrativo para aplicação das penalidades previstas em lei ou, caso a denúncia não seja procedente, arquivar a reclamação em definitivo.