Capa Capital

Paulo Rebêlo (*)
Observatório, 02.dezembro.2003

Foi com surpresa que percebi: duas semanas haviam passado e eu não tinha lido nada sobre a capa publicitária da edição 266 da revista Carta Capital, de 12 de novembro de 2003. Por sinal, a mesma peça repetiu-se na edição seguinte, 267.

Não é uma crítica. Apenas uma certa frustração por não ter entendido. Como leitor, frustração por não ter compartilhado dos bastidores dessa vitória financeira (?) da revista e do paradoxo de, justamente naquela edição 266, a principal e mais elogiada reportagem ter sido sobre anúncios vs. notícias.

Quando recebi a edição 266 pela porta de casa, a primeira reação foi de susto. O que aquela capa tinha a ver com a publicação que mais admiro no Brasil? Não entendi. Uma reportagem de capa sobre Atlanta como roteiro de viagem pela Delta Airlines, na revista que, imagino, nove em 10 jornalistas gostariam de se ver publicados? Nada a ver.

Só depois de um tempo é que percebi, escondido em letreiro vertical, o aviso: “sobrecapa publicitária”. Respirei aliviado e o susto se transformou em alegria.

Alegria, pois para colocar uma capa dessas, idêntica a uma capa tradicional de Carta Capital, inclusive com as chamadas no mesmo estilo gráfico e com a mesma abordagem lingüística, deve ter sido uma boa grana a entrar nos cofres da revista. Seria a única explicação para distribuir uma capa publicitária idêntica a uma normal, com todos os detalhes. É diferente de sobrecapas e encartes que estamos acostumados a ver.

Como leitor, há anos acompanho a epopéia de Carta Capital, pelos editoriais, em relação aos semanários concorrentes, à tiragem pequena, ao grupo de leitores restritos, as dificuldades financeiras da revista. E, de longe, fico torcendo para que as coisas melhorem, para que a tiragem aumente, para que anunciem mais, para que a distribuição melhore na região onde moro.

Partiu meu coração quando, em certa edição que já não lembro, abro o índice e percebo que a tiragem havia diminuído dos tradicionais 75 mil exemplares para os 56 mil de hoje. Fiquei pensando, como penso ainda agora, como uma revista dessas pode ter uma tiragem tão pequena, enquanto outras, com seus conteúdos deturpados, às vezes claramente tendenciosos, superam a marca de meio milhão de exemplares.

Foi por isso que devorei as primeiras páginas da edição 266, apressado para chegar ao editorial, esperando ler alguma coisa, qualquer coisa, sobre a sobrecapa publicitária. E não havia absolutamente nada. Nem uma nota, sequer. Talvez na 267.

Só que a edição 267 chegou e também não tive o prazer de compartilhar dessa vitória e continuei sem entender. A sobrecapa foi somente para assinantes? Chegou às bancas também? Foi para o Brasil inteiro? Foi uma experiência ímpar ou tende a se repetir no futuro? Rendeu bem? Não me interessa saber quanto, mas rendeu bem? Uma sobrecapa publicitária de Carta Capital, em conseqüência de sua credibilidade, isenção e profissionalismo, deveria ser a sobrecapa mais cara do Brasil. Espero que tenha sido.

(*) Jornalista no Recife – www.rebelo.org