Apagão, louvado sejas tu

Paulo Rebêlo // maio.2001

É incrível como ainda existem pessoas que não conseguem ser simpáticas ao apagão. Parece mentira, mas ainda tem gente que não aprende: esta é uma oportunidade única em nossas vidas. São tantas coisas boas em conseqüência do apagão que apenas uma crônica não foi suficiente. O tal Ministro do Apagão, Pedro Parente (parente de quem, ninguém sabe), anunciou que o governo começa a analisar a possibilidade de decretar como feriado nacional a segunda-feira. Todas elas.


Parece piada? Então deixe sua intelectualidade de lado, tente se tornar um reles cidadão comum e leia um bom jornal. Para ser mais específico, a edição da sexta-feira do dia 25 de maio, 2001.

Toda segunda-feira pode ser feriado, vejam só a maravilha. Uma dádiva dos deuses. Quer dizer, uma dádiva dos santos: São Pedro, principalmente. Apagão, louvado seja. Mesmo assim, ainda tem gente que critica o governo por conta do apagão. Pela primeira vez em sete anos de mandato o homem vai fazer uma coisa boa pelos brasileiros e ainda ficam reclamando. Haja paciência.

Sem energia elétrica, pelo menos teremos a segunda-feira enforcada para aproveitar o apagão. Melhor ainda se o aproveitamento tiver um contexto mais… fértil.

Entretanto, urge uma reflexão acerca do assunto. Na eventualidade de toda a segunda-feira ser feriado em detrimento do apagão, pela lógica, não seria muito melhor se todos nós gastássemos ainda mais energia elétrica para, de tal forma, o governo decretar feriado também na sexta-feira?

Destarte, o país não apenas economizaria energia, como também daria um impulso na economia etílica. Com a segunda e a sexta feriados, o país haveria de ser o paraíso dos botequins, o éden das cervejarias.

Enfim, o supra-sumo da qualidade de vida.

Inclusive, o funcionário público não mais precisará continuar “enforcando” a sexta-feira de trabalho. Logo, poderá enforcar a quinta-feira. Quinta, sexta, sábado, domingo e segunda para ajudar o Brasil a economizar energia elétrica. Trabalhar durante dois dias e folgar cinco, em prol do Brasil. Apagão, louvado seja.

Confesso que, de fato, ficar cinco dias por semana na farofada pode ser uma medida drástica, penosa, difícil. Todavia, precisamos pensar na pátria. Pela nação, acho que vale a pena fazer o esforço. Afinal de contas, são apenas cinco dias semanais de folga, não precisa entrar em desespero, com o tempo você se acostuma. Sei que é difícil, mas o país precisa de você.

Infelizmente, como nem todos os homens são perfeitos e nem todas as crianças são felizes, vejo um grave problema à frente: com as medidas de contenção, é possível que o país economize energia suficiente para fazer com que nossos suados feriados de segunda-feira sejam repensados, quiçá, abolidos. Não podemos deixar que aconteça.

A solução, a meu ver, é simples: gaste energia. Quanto mais energia você gastar, melhor para você, melhor para o Brasil. A conta de luz pode vir mais cara no fim do mês, mas será compensada pelos dias de folga — quer dizer, pelos dias de ajuda voluntária à pátria.

Procure o equilíbrio entre a conta de luz e a manutenção do feriado às segundas. Não é difícil, basta seguir o notório e eficiente exemplo do funcionalismo público brasileiro, isto é, o equilíbrio entre a falta do que fazer e a vontade de não trabalhar.

Você quer mais motivos para louvar o apagão? Leia os jornais de sábado (26/maio) e domingo (27/maio). Perceba que o preço dos eletrodomésticos pode cair, a começar pelo ferro de passar roupa, ar-condicionado e freezer. É a hora certa de você comprar aquele eletrodoméstico que sempre quis ter… mas o salário nunca deixou.

Na ocasião de você ter vocação para agiotagem, talvez seja a hora de comprar vários eletrodomésticos, fazer um milheiro de promessas para que chova bastante no próximo ano, e então vender a preços de mercado em 2002 as sobras adquiridas de eletrodomésticos em 2001. Lucro garantido.

E ainda tem gente que critica o governo por causa do apagão. Dá para acreditar? Apagão, louvado seja. E se a sexta-feira for feriado, FHC tem o meu voto para o terceiro mandato.