Não fale conosco

Paulo Rebêlo
Observatório da Imprensa
01.outubro.2013
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Leu uma reportagem e quer elogiar ou criticar o autor do texto? É mais fácil encontrar o e-mail de Barack Obama do que o de um repórter nos jornais brasileiros. Toda a hierarquia – repórteres, editores, chefes de Redação, diretores – parece preferir assim. Dizem que é para evitar a enxurrada de propaganda e releases inúteis das assessorias de imprensa. Aparentemente, é mais útil esperar que a assessoria telefone para a Redação para pedir o e-mail do repórter. Uma informação quase ultrassecreta, restrita apenas aos assessores. Também dizem que é para evitar spam ou para não sobrecarregar o servidor do jornal e o escasso (porém, barato) tempo do jornalista. Aparentemente, os jornais não descobriram a existência de inúmeros filtros antispam. Gratuitos.

O problema é que todo mundo sabe que o real motivo é outro. Se antes da internet os jornais já não gostavam de receber críticas do leitor, hoje a arrogância (ou o medo) é ainda maior. E sem razão de ser, diante da cada vez mais inócua atuação dos jornais. Diante de uma real e saudável possibilidade de retroalimentação com seu público-alvo, os jornais continuam a optar pelo caminho inverso: preferem se fechar ainda mais no mundinho que só eles (acham que) entendem. Ao leitor, resta a seção de cartas, os raros ombudsman e ouvidorias, o departamento comercial e o de assinaturas.

Porque todo mundo sabe que o leitor é essa subespécie inferior, desinformada, histérica e que se acha cheia de direitos. É o mesmo ser inferior que, às vezes, sabe e entende mais do assunto em questão do que o autor da reportagem que, não raramente, escreve sobre juros da dívida ou spread bancário sem entender bulhufas de uma coisa ou outra.

Apenas o nome

Mesmo assim, fazemos questão de assinar a matéria. Só não queremos receber mensagens com dúvidas, questionamentos ou críticas. O poder é nosso. Editores e diretores viajam e participam de inúmeros congressos para repensar o futuro do jornalismo, novas narrativas de reportagem e vários outras firulas convergentes. Voltam para o jornal e perpetuam as mesmas práticas arcaicas de achar que são representantes da opinião e do interesse da sociedade. Perpetuam um modelo engessado de atuação, conforme tratamos neste Observatório (ver “Reforma não sai porque o gesso não quebra“).

Na primeira página do site do Estado de S.Paulo, temos o Fale Conosco. Você vai encontrar o e-mail de Classificados, Atendimento, Publicidade e Anúncios Fúnebres. Desça um pouco mais a tela e existe o Fale com os Editores. O problema é que não há editores para falar. Existe apenas o atendimento genérico ao leitor. Se você quiser achar quem é o editor de Internacional, por exemplo, boa sorte. Pelo site do jornal, ninguém sabe quem edita nada. Será que até para isso a gente precisa comprar o jornal papel? Outro dia perguntei a uma ex-funcionária do Estadão. Sua resposta: “Eu não sabia quem editava Internacional nem quando trabalhava lá, muito menos agora”. Talvez seja mais fácil perguntar a algum colega de assessoria. Informação secreta é com eles. Pelo site, você pode tentar entrar em cada editoria, individualmente, para procurar. Sem sucesso. Nem editor, nem repórteres.

No expediente do jornal O Globo você vai descobrir quem são os editores responsáveis por cada editoria. Já melhorou. Tem apenas o nome, sem telefone e sem um e-mail para contato. Adiantou de nada. Tem que procurar no Google e, com sorte, achar algum e-mail que ainda exista.

Expediente desatualizado

Se não quer colocar o e-mail na internet, seja lá qual for a razão, que tal um simples formulário direcionado a cada repórter e cada editor? É difícil, a gente sabe. Um programador mediano leva quase cinco minutos para criar um formulário desses, com o nome de cada repórter.

No jornal O Dia, o expediente segue o mesmo modelo do concorrente da família Marinho. Na Folha de S.Paulo, o expediente é tão enxuto quanto jurássico. Além do nome dos mestres dos magos (diretoria), não há nada mais além dos e-mails genéricos de atendimento ao leitor, Clube Folha, Folha Press, Fale com a Gente. Se você quiser falar com o comercial da Folha, eles aparentemente não usam e-mail. Só telefone. Talvez seja assim: você liga para eles e pede o e-mail. Será? E são dois departamentos separados e com números diferentes: um para anunciar na Folha de S.Paulo e outro na Folha de S.Paulo (impresso).

Internet ainda é uma novidade dentro dos jornais, aparentemente. Quase todos os jornais seguem a mesma cartilha, de uma ponta a outra do Brasil. Há, contudo, uma situação que merece reflexão. É melhor ter um expediente desatualizado ou não ter expediente? Porque em muitos dos jornais que pesquisamos, o expediente no site ainda conta com o nome e o e-mail de editores ou repórteres que há meses não trabalham mais no jornal. Ninguém sabe onde foram parar, mas pela internet eles ainda respondem pela editoria de cadernos.

Com o mesmo nome

Curiosidade: o problema também ocorre neste Observatório da Imprensa. A cada semana, tenho vontade de trocar umas ideias com alguns autores. Desisto. O e-mail deles nunca aparece. O meu e-mail ou site, por mais que eu peça para publicarem a cada colaboração, também não sai. Não sei se o Observatório não coloca nossos sites pessoais ou profissionais por achar que isso seria propaganda gratuita? Também nunca me responderam quando perguntei. Só não sei o que a gente ganha, sinceramente. [Nota do OI: O Observatório não informa e-mails de autores de artigos, mas divulga endereços de sites e blogs, quando solicitado. (L.E.)]

Vou no Google ver se encontro algum contato do autor. Às vezes pelo Facebook. Nem sempre encontro porque existe esse fenômeno sobrenatural e psicodélico de haver pessoas com o mesmo nome na internet.

Essa tal de internet não aprende mesmo.

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