Quando elas dizem sim

Paulo Rebêlo
Portal NE10 | 07-maio-2012 | link

Uma das maiores surpresas da minha vida foi quando convidei uma mulher bonita para sair e ela aceitou.

Sem saber, ela acabara de violar a regra mais universal da adolescência masculina: a de que mulheres bonitas só querem sair com homens bonitos.

Todos os meus objetivos de vida perderam o sentido.

Eu não precisava mais ser fortão para que as mulheres bonitas olhassem para mim. Não precisava mais estudar para arrumar emprego. Não precisava mais ler vários livros por mês para parecer inteligente. Não precisava mais assistir filme francês para parecer descolado. Não precisava mais ser marxista para dar pinta de cabecista. Não precisava mais rezar antes de dormir para ver se acordava um pouco menos feio. Não precisava mais reclamar da genética por ser baixinho e míope.

Enfim, não precisava mais tentar ser alguém teoricamente interessante para mulheres supostamente interessantes.

Então o que sobrava para eu fazer da vida?

Foi a abertura do Portal de Belzebu para um mundo totalmente novo e inexplorado.

Fui à livraria procurar algum manual ou guia ilustrado, mas não encontrei. Deixei os filmes europeus de lado e fui assistir James Dean e Marlon Brando, mas não aprendi nada porque eles não precisavam fazer nada. As mulheres simplesmente se derretiam só de ver a sombra deles projetada na parede.

Resolvi pedir conselhos aos amigos, mas eles sabiam tanto quanto eu. Ou seja, nada.

Procurei auxílio com meus companheiros do bar, mas eles não lembravam mais.

O garçom sugeriu perguntar qual era o time que a moça torcia e tentar engatar uma conversa a partir daí. Todos da mesa concordaram. Notei que alguns anotaram a dica no guardanapo e esconderam no bolso da camisa.

Mas se hoje não entendo nada de futebol, naquela época entendia menos ainda.

O problema não era simplesmente ser jovem demais para sair com mulheres mais interessantes do que as nossas colegas do bairro, do colégio ou do início da faculdade.

No fundo, a gente sabia que nossas colegas de classe saíam conosco por falta de opção, porque elas já nos achavam desinteressantes desde então.

Problema mesmo era saber o que uma mulher feito aquela moça esperava do mundo.

Fomos à Praia de Boa Viagem, opção econômica onde sempre dava para comprar a garrafa de Montilla com um litro de Coca-Cola. Tudo dividido com a reca de gente que se achava Fidel Castro ou Che Guevara por estar bebendo cuba libre. Para depois pegar dois ônibus e voltar para casa com a certeza absoluta de ter começado a revolução armada.

É claro que deu tudo errado. No encontro e na revolução.

Quando finalmente nosso encontrinho acabou, me dei por vencido e fui dormir feliz.

Feliz porque o mundo finalmente havia voltado às condições normais de temperatura e pressão. Foi quase como o fim da Crise dos Mísseis. Teria sido a primeira e última vez que uma mulher daquelas iria dar bola para um mequetrefe.

Até o dia em que ela ligou perguntando quando iríamos sair novamente.

E quem saiu fui eu, correndo para bem longe do telefone. Uma mulher dessas não podia ser normal, devia ter um parafuso a menos. Nunca mais a vi.

Muitos anos houveram de passar para a gente se transformar nesses seres barrigudos e carecas, supostamente experientes e vividos. Mesmo assim, quando elas dizem sim, saio correndo para escutar a resenha esportiva no radinho de pilha. Só por precaução.

Funciona tão bem quanto a revolução armada.

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